Órgão da prefeitura de São Paulo quer garantir direito à alimentação adequada

Publicado dia 07/04/2015

Comer bem e de forma saudável consta entre os direitos sociais previstos no artigo 6º da Constituição Federal. A conquista, agregada por meio de uma emenda em 2010, vem para somar aos esforços de outras políticas que buscam dar diretrizes a planos, programas e ações que assegurem o direito à alimentação adequada, caso do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) concebido em 2006. Embora esse caminho ainda esbarre em empecilhos, e demande esforços coletivos, há quem faça o exercício de repensar a estrutura e articulações possíveis em prol de uma oferta alimentar qualificada e sustentável, movimento reconhecido na subprefeitura do Butantã.

A temática da segurança alimentar encontrou a rede ainda em 2001, a partir de uma proposta do Instituto Pólis, organização que atua na construção de cidades justas, sustentáveis e democráticas, por meio de pesquisas, assessoria e formação que resultem em políticas públicas e no avanço do desenvolvimento local. A interface se deu à época com a administração regional, atual subprefeitura, a partir da assistência social, hoje a Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS).

O ponto de partida para pensar uma ação territorial tendo em vista a segurança alimentar veio do contexto no qual se inseria um dos bairros da região, Jardim Jaqueline, marcado por uma situação de vulnerabilidade social que fazia com que muitos moradores buscassem o sustento a partir de condições precarizadas, como venda de materiais recicláveis encontrados no Parque Raposo Tavares, espaço público da região.

(Re) conhecendo ações e atores

As primeiras conversas surgiram no sentido de mapear quais ações relacionadas à segurança alimentar já existiam no território e quais atores estavam por trás delas. Com isso, foi possível tomar conhecimento de práticas da Pastoral da Criança, atendimentos do Programa Leve Leite e outras que contavam com a organização da comunidade. A partir desse mapeamento, surgiu a ideia de vincular essas atividades a proposições públicas, e de pensar em um centro capaz de promover esses diálogos a partir de uma proposta educativa, em que não fosse discutido só o alimento e a alimentação, mas sua produção, distribuição, e formas de promover articulações para o desenvolvimento local, em um arranjo sustentável.

Créditos: divulgação

Créditos: divulgação

Em 2003, a Secretaria do Municipal do Verde e do Meio Ambiente (SMVMA) foi convidada a compor o grupo de discussão por conta da oferta de um curso de consumo consciente, atrelado à diretiva de educação ambiental. Durante sete anos, representantes da comunidade, como as Faculdades Integradas de São Paulo (FISP), parceira na época, e instituições, lideranças e poder público – via pastas da Saúde, Assistência Social, Cultura e Esporte – participavam de reuniões mensais para estruturar estratégias que qualificassem a alimentação da população local, tanto nas escolas, quanto nos diferentes centros de atendimento e serviços públicos.

Uma das ações que passou a participar da iniciativa, a Feira de Economia Solidária, que acontece até hoje, foi importante para que cada integrante pudesse entender a sua contribuição, já que falar de segurança alimentar implica diversos contextos, como explica a técnica da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente (SVMA) da Prefeitura do Município de São Paulo, Solange Cavalcante da Silva Redolfi. “Não se trata do alimento já pronto simplesmente, mas de outras questões sociais, como o descarte de lixo, tratamento da água e as pessoas que não têm renda para acesso à alimentação. A ideia é contemplar as necessidades dos indivíduos na integralidade e esse pensar compartilhado vai a favor disso, visto que o nosso público é único, ou seja, o indivíduo que está na escola é o mesmo que frequenta a rede de saúde, acessa parques, atividades culturais e outros equipamentos da comunidade”, atesta.

O início do Centro de Referência

predio CRSANSEm 2010, para dar lugar às ações compartilhadas e permitir a interface entre poder público e ações comunitárias, foi estruturado o Centro de Referência em Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável da Cidade, lançado oficialmente pelo Decreto nº51359. O equipamento surgiu pautado na segurança alimentar e nutricional saudável que parte dos seguintes compromissos: garantir o direito humano à alimentação de forma sustentável, preservando os recursos naturais para as gerações futuras; valorizar a cultura do alimentar saudável de cada região; garantir acesso ao alimento saudável com qualidade e em quantidade nas diferentes etapas da vida; educar para a conscientização das pessoas para a manipulação e consumo adequado do alimento, reconhecendo seu significado cultural e social; aproveitar ao máximo o que está disponível nos alimentos; conhecer e integrar as diversas etapas do circuito alimentar: produção, processamento, distribuição, abastecimento, armazenamento e consumo consciente.

Na prática, isso se traduziu em uma atuação bem ampla, dada a partir da demanda que o grupo articulador apontava em cada reunião. Embora a Secretaria Municipal  do Verde e do Meio Ambiente seja a responsável, há uma gestão compartilhada para pensar as ações a partir de um esforço coletivo para contemplar a realidade local.

Nesse contexto, são várias as atividades realizadas pelo e no equipamento. Uma das oficinas realizadas foi de políticas públicas para que a comunidade não só acessasse a oferta dos equipamentos disponíveis no território, mas se torne ciente da responsabilidade de cada um. Na ação, estiveram presentes as Secretarias do Verde, Saúde, Assistência e Desenvolvimento Social, o Instituto Pólis, representando o terceiro setor, e a Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (ITCP) da Universidade de São Paulo.

Oficinas ou cursos sobre hortas, plantios em pequenos espaços, culinária e cozinha doméstica também são ações bastante comuns ao espaço, sempre na perspectiva multi, inter e transdisciplinar, como explica Solange. “Tivemos uma demanda com os beneficiários dos programas de transferência de renda que recebem a cesta básica e, muitas vezes, não sabem como utilizar seus insumos”, explica. A gestora conta que foi planejada uma formação com as equipes da assistência social sobre segurança alimentar, para que elas pudessem orientar de maneira qualificada o uso desses alimentos. Em um segundo momento, isso também foi ofertado às famílias, em um curso de cozinha doméstica, cujo foco era orientar o manejo de certos alimentos em uma perspectiva nutricional.

consumo consciente_18_04 066No caso das escolas, a parceria se dá com a Diretoria Regional de Ensino (DRE) Butantã, partindo dos insumos da merenda escolar. A ação contempla as merendeiras e a formação busca desenvolver um novo olhar para os alimentos para diversificá-los do ponto de vista nutricional, com oferta de receitas que usam cascas e talos. Também se leva em conta o sabor, agregando novos temperos. A formação abrange professores, alunos e familiares, uma vez que a manutenção de uma horta escolar, por exemplo, já se configura como uma ação possível na política de segurança alimentar.

Mais do que ações pontuais, o Centro de Referência busca disseminar práticas que possibilitem desdobramento na comunidade. A ideia é que a temática possa ser contemplada pelos diversos equipamentos do território e apoie a formação da comunidade, prevendo seu empoderamento, autonomia, e direitos. “Repensar os hábitos alimentares e demais condutas é, sobretudo, uma mudança cultural, que só pode ser alcançada em um arranjo maior”, defende Solange.

Principais resultados

O CRSANS é o primeiro centro de referência do município de São Paulo. Para a equipe gestora, o equipamento fortalece a mobilização comunitária e a cidadania, uma vez que possibilita a participação ativa da sociedade e fortalece o papel de controle social. Em todo o território, é possível identificar ações que dialogam com a política de segurança alimentar, embora ela envolva um arranjo ainda mais amplo. No caso das escolas, o centro apoiou as unidades  a pensarem práticas sustentáveis no cotidiano escolar. Também já é possível identificar o movimento de alguns coletivos dispostos a pensar a economia solidária, e outros pontos para o desenvolvimento local tomando as unidades de ensino como centro de processos educativos comunitários.

A partir da experiência com o CRSANS,  a expectativa é que se caminhe para a consolidação de uma Política de Segurança Alimentar no território, percurso que vai sendo trilhado pelo coletivo junto às conferências de segurança alimentar e nutricional nas esferas municipal, estadual e federal. Também há a projeção de que o equipamento contemple as demais regiões da cidade, e seja replicado em outros quatro endereços.

Contato:
Centro de Referências em Educação Alimentar
Rua Nella Murari Rosa, nº 40, Jd. Jaqueline
Telefone: (11) 3731-7126

Escola

Como o território pode ajudar as crianças a ter uma alimentação mais saudável?

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