publicado dia 18/09/2015
Nos últimos 11 anos, 277 escolas rurais foram fechadas por mês no Brasil
Reportagem: Caio Zinet
publicado dia 18/09/2015
Reportagem: Caio Zinet
O número de escolas rurais diminuiu drasticamente nos últimos 11 anos. Segundo dados do Censo Escolar, existiam 103.328 escolas rurais no Brasil em 2003, esse número caiu para 66.732 no ano passado, o que equivale ao fechamento de cerca de 277 instituições rurais por mês, ou 9 por dia.
O cenário piorou nos últimos anos: entre 2013 e 2014 foram fechadas 4.084 escolas rurais, o equivalente ao corte de aproximadamente 340 instituições por mês, ou pouco mais de 11 por dia.
Com a redução da população rural, esse fenômeno é de certa forma esperado, mas o ritmo de fechamento das escolas tem sido superior ao número de alunos que ainda necessitam ser atendidos pela rede pública nessas localidades.
Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) aponta que, em 2010, havia o registro de 8,7 milhões de alunos matriculados na educação básica que residiam no campo, enquanto o número de estudantes matriculados em escolas rurais era de pouco mais de 6 milhões.
Dessa forma, em 2010, existia um contingente de 2,7 milhões de crianças e jovens que se deslocavam todos os dias do campo até alguma cidade próxima para conseguir estudar. Ainda segundo a pesquisa do Ipea, em 2008, essa diferença era de 2,5 milhões.
Para especialistas, os municípios têm fechado escolas rurais porque elas têm um custo relativamente mais caro que as urbanas. Isso acontece porque o número de estudantes por sala é menor nas rurais.
Além disso, algumas das principais fontes de financiamento dos municípios para a educação estão atreladas ao número de alunos, como é o caso do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).
Dessa forma, quanto menos matriculados, menor é o repasse do Fundeb para os municípios. Os custos, no entanto, continuam parecidos, pois o número de professores permanece praticamente o mesmo, porém com um número menor de alunos; os gastos com manutenção também se mantêm praticamente estáveis.
Os pesquisadoras do Ipea, Eduardo Luiz Zen, Paulo Meyer Paulo Roberto Corbucc, concluíram que as possíveis explicações para o processo acelerado de fechamentos de escolas rurais podem ser encontradas no desenho da política nacional de educação, que acaba por incentivar as prefeituras a buscar recursos para transporte escolar e não para manter os alunos próximo ao seu local de moradia.
“O programa federal de apoio à educação mais estruturado para o meio rural, principalmente em termos de recursos financeiros, é o fomento ao transporte escolar. Ocorre que, no ponto de vista das prefeituras, que são as responsáveis pela maior parte das escolas do campo, como há uma maior facilidade para obter financiamento para o transporte escolar do que para a manutenção de escolas, pode estar havendo uma indução tácita, não intencional, da política nacional de transporte escolar, levando ao fechamento de cada vez mais escolas do campo”, registra o estudo.
Para o ex-presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e professor de Educação da Universidade de Brasília, Luiz Araújo, os municípios têm fechado escolas porque precisam cortar custos de suas Secretarias de Educação.
“São vários motivos para o fechamento das escolas rurais, mas todos eles se resumem a uma estratégia de diminuir custos. As escolas rurais tem um custo por aluno maior que as instituições urbanas. Em muitos casos é mais barato investir em transporte para uma cidade próxima do que manter os estudantes na escola rural ”, afirmou.
De acordo com o ex-presidente do Inep, isso traz um prejuízo enorme para os estudantes que, em sua maioria, acabam sendo redirecionados para estudar nas escolas das regiões urbanas mais próximas, o que causa inúmero prejuízos e reforça desigualdades sociais.
“O aluno sai do seu universo cultural, que facilitaria o processo de aprendizado, despende mais energia para ir até a escola do que os estudantes da cidade e ainda corre um risco maior de descontinuidade do transporte. Isso tudo reforça a lógica de desigualdade social no ensino”, conclui.
Dados da campanha Fora da Escola Não Pode apontam para um cenário de grande desigualdade entre os alunos de escolas urbanas e rurais. A taxa de frequência média de um adolescente entre 15 e 17 anos em uma escola rural é de 78,3%, enquanto que na cidade o índice é de 84,4%.
Isso pode ser explicado em parte pelo problema de falta de transporte escolar. Dados da campanha apontam que, em 2012, dos 6.078.829 alunos matriculados em escolas rurais no Brasil, 3.611.733 não eram atendidos por sistemas de transporte escolar público, o que corresponde a aproximadamente 59% do total.
As diferenças regionais são marcantes. Enquanto na Região Sul apenas 29% dos estudantes da zona rural não são atendidos por transporte escolar, na Nordeste a taxa fica em torno de 67%. Este índice é mais alto que o da Região Norte (57%).
A taxa de distorção idade-série é outro indicador que mostra que a educação no campo está em situação mais precária. No ensino fundamental essa taxa é de 19,9% para escolas urbanas e de 33,7% nas rurais, no ensino médio esses índices saltam para 30,6% e 43,5%, respectivamente.
Outra grande desigualdade diz respeito à acessibilidade para alunos com deficiência. O índice de escolas públicas com salas de atendimento especial é de 12% na rede urbana e de apenas 0,9% na rural.
Para Luiz Araújo esse quadro de desigualdade aponta a necessidade do Estado colocar mais recursos para evitar o fechamento de escolas em cidades rurais. “A educação rural pode ser mais cara, mas existem determinados serviços públicos que são mais caros mesmo e é preciso garantir a sua oferta mesmo assim”, afirmou.