publicado dia 11/04/2016

Nenhuma das metas do PNE que vence até 2016 será cumprida plenamente

Reportagem:

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Após muita discussão, o Plano Nacional de Educação (PNE) foi aprovado pelo Congresso Nacional, em 2014, estabelecendo as metas que devem ser cumpridas pela União, estados e municípios até 2024, com o objetivo de garantir uma educação universalizada e de qualidade no país.

Algumas das metas já venceram no ano passado e outras têm prazo para julho ou dezembro deste ano. O Centro de Referências em Educação Integral realizou um levantamento e conversou com especialistas para saber se as metas serão cumpridas.

A estimativa é que nenhuma delas seja plenamente cumprida. Veja abaixo uma lista com os principais objetivos e em que estágio estão.

metas do pne vencem 2016

 

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Meta de universalizar educação infantil em 2016 não deve ser cumprida.

#Meta 1Universalizar, até 2016, a educação infantil na pré-escola para as crianças de 4 a 5 anos.

Prazo: final de 2016

Segundo levantamento do Todos Pela Educação, em 2014 o país tinha 89,1% de suas crianças matriculadas na educação infantil. Em 2005 o índice era de 72,5%. Entretanto, apesar do país estar mais próximo da meta, o ajuste fiscal e a crise política devem inviabilizar o seu cumprimento.

Em 2015 foram cortados cerca de R$ 10 bilhões do orçamento do Ministério da Educação (MEC). Desse total, R$ 3,4 bilhões foram retirados do programa Proinfância, do governo federal, que investe na construção de novas creches e pré-escolas.

Diante da restrição orçamentária, o governo federal alterou sua estratégia e ao invés de construir prédios novos, com base em algumas opções de plantas básicas tidas como ideais para as crianças, o MEC decidiu financiar a reforma de alguns prédios já existentes.

Apesar de buscar essa alternativa, especialistas apontam que a chance da meta ser alcançada até o final do ano é remota. O coordenador nacional da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, explica que, com os cortes no Proinfância, a responsabilidade por ampliar o atendimento recaiu muito sobre os ombros dos estados e municípios que, desde 2012, sofrem com uma crise da arrecadação e, mais recentemente, têm sentido também os impactos da crise econômica.

“No caso da educação infantil, há um problema grave que é a desconstrução do Proinfância; isso jogou o peso da universalização nas costas dos estados e municípios. Isso praticamente inviabiliza o cumprimento da meta de universalizar a educação infantil para crianças entre 4 e 5 anos ao final de 2016 como previsto no PNE”, afirmou Daniel.

Para o presidente União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Alessio Costa Lima, houveram avanços importantes nos últimos anos em relação à matrícula de crianças na educação infantil e em alguns anos a ampliação esperada deverá ocorrer.

Segundo ele, inúmeros municípios não possuem recursos para construir escolas e expandir suas redes e, portanto, não conseguem aumentar a oferta de vagas. Alesssio avalia que nas grandes cidades existe outro problema que é a insuficiência de espaços e terrenos adequados para a construção de novas creches e escolas.

“Em 2016 acredito que vamos nos aproximar ainda mais da meta do PNE. Tenho uma visão positiva porque crescemos nos últimos anos e vamos continuar assim, mas não devemos chegar a esses 100% ainda em 2016”, afirmou.

Ele criticou o ajuste fiscal e lembrou que a restrição orçamentária afetou não somente as construção de novas unidades, mas também um programa central para a educação infantil, o Brasil Carinhoso. Esse programa repassa verbas para o funcionamento de creches que atendem crianças de 0 a 6 anos cujos pais são beneficiários do Bolsa Família.

“O corte é algo que não deveria ter acontecido. As escolas do Brasil Carinhoso receberam somente este ano os repasses de 2015 e, ainda por cima, foram encaminhados somente 50% dos valores devidos. Essa verba é essencial para garantir a infraestrutura das escolas”, afirmou o presidente da Undime.

Cerca de 1,6 milhão de jovens estão fora da escola segundo o Censo Escolar 2015

Cerca de 1,6 milhão de jovens estão fora da escola segundo o Censo Escolar 2015

#Meta 3Universalizar, até 2016, o atendimento escolar para toda a população de 15 a 17 anos.

Prazo: final de 2016. 

Assim como a meta de educação infantil, o objetivo de colocar todos os jovens na escola também está seriamente ameaçado. O ministro da educação, Aloízio Mercadante, apresentou em março os dados do Censo Escolar de 2015, que mostram que existem cerca de 3 milhões de crianças e adolescentes fora da escola. Desse total, 1,6 milhão tem entre 15 e 17 anos.

O governo identificou cada uma desses jovens, onde moram, e anunciou que fará uma busca ativa em parceria com outras pastas para que esses alunos retomem os estudos.

Especialistas avaliam que ainda assim é muito difícil garantir que todos os jovens dessa faixa etária estejam dentro da escola até o final de 2016, já que nos últimos anos houve poucas iniciativas nesse sentido.

“Na prática não foram realizadas medidas gerais em relação a essa pauta nos últimos anos. Os dados vão mostrar, muito provavelmente, que não foi universalizado. Existe também o olhar para além da matrícula que é questão da permanência. Ainda que não seja factível um índice de 100%, precisamos reduzir a taxa de evasão também”, afirmou o professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), Salomão Ximenes.

Existem 13,3 milhões de analfabetos no Brasil, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

Existem 13,3 milhões de analfabetos, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad)

#Meta 9: Elevar a taxa de alfabetização da população com 15 anos ou mais para 93,5% até 2015. 

Prazo: 2015 

Ainda não existem dados relativos ao analfabetismo acima dos 15 anos para o ano de 2015, mas a evolução histórica dos dados mostra que dificilmente essa meta tenha sido cumprida. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (PNAD) de 2014, o índice de pessoas que se disseram alfabetizadas foi de 91,7%.

Em 2007 a porcentagem era de 89,9%. Ou seja, em sete anos o número subiu apenas 1,8 pontos percentuais, um ritmo de 0,25 pontos por ano. Mantido esse ritmo, o Brasil não terá atingido a meta quando o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgar os dados de 2015.

Para Salomão, além da questão do índice quantitativo, existe a questão qualitativa. Dados de pesquisa feita em 2011 e 2012 pela Ação Educativa e pelo Instituto Paulo Montenegro apontam que apesar da melhoria significativa no número de analfabetos desde 2002, o índice de pessoas plenamente alfabetizadas permaneceu estável em 26%.

O que aumentou de 2002 para 2012 foi o índice de pessoas com índice considerado básico de alfabetização, saltando de 34% para 47% do total de jovens e adultos do país. Também foi reduzido o número de analfabetos funcionais – 39% para 27% no mesmo período.

“É necessário planejar políticas de alfabetização pensando na articulação com a educação formal para que se dê prosseguimento a se incentive a leitura e a escrita. Dessa forma, é possível efetivamente aumentar o grau de capacidade de literatura e escrita da nossa população”, afirmou Salomão.

dialogo formacao

Política de formação docente é considerada essencial para melhor qualidade da educação.

#Meta 15: Garantir, em regime de colaboração entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, no prazo de 1 ano de vigência deste PNE, política nacional de formação dos profissionais da educação de que tratam os incisos I, II e III do caput art. 61 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, assegurado que todos os professores e as professoras de educação básica possuam formação específica de nível superior, obtida em curso de licenciatura na área de conhecimento em que atuam.

Prazo: 2015

O Conselho Nacional de Educação (CNE) aprovou em junho do ano passado um parecer com diretrizes para a formação docente. Apesar do avanço, especialistas não consideram isso como uma medida que realmente tenha efetivado o que está previsto na meta.

“Foi um primeiro passo, mas é necessário estruturar e viabilizar o programa na prática”, agregou. Para ele, é preciso pensar em como garantir que a política de formação chegue para os professores que mais necessitam.

“Não adianta nada aumentar muito o número de vagas em programas de formação docente se isso não chega nas cidades mais distantes dos grandes centros onde o problema é maior”, detalhou o presidente da Undime.

Daniel Cara também avalia que apesar desse primeiro passo dado pelo CNE, a política nacional de formação ainda está longe de chegar aos professores de toda a rede pública do país.

“A política nacional de formação não deve se limitar a diretrizes normativas. Ele precisa se tornar uma política pública efetiva que chegue de fato nas redes e isso não aconteceu até o momento”, afirmou o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito a Educação.

A revisão dos planos de carreira dos professores da educação básica é um das metas do PNE

A revisão dos planos de carreira dos professores da educação básica é um das metas do PNE

#Meta 18: Assegurar, no prazo de 2 anos, a existência de planos de carreira para os (as) profissionais da educação básica e superior pública de todos sistemas de ensino e, para o plano de Carreira dos (as) profissionais da educação básica pública, tomar como referência o piso salarial nacional profissional, definido em lei federal, nos termos do inciso VIII do art. 206 da Constituição Federal.

Prazo: junho de 2016 

O Ministério da Educação (MEC) montou um sistema de apoio para as secretarias municipais e estaduais de educação de todo o país que visa orientar revisões em todos os planos de carreiras docentes.

Também está promovendo cursos de formação de profissionais para orientar as secretarias. Apesar desse movimento, acredita-se que a medida não é suficiente para que se possa considerar a meta como cumprida já em junho deste ano.

“Uma coisa é a cidade ou o estado ter apoio para elaborar melhor um plano de carreira outra coisa é ter os recursos para sua implementação. Torna-se uma medida quase demagógica porque se você apresenta um plano, mas não tem como viabilizá-lo e se torna inócuo”, afirmou Daniel Cara.

Essa meta se articula diretamente com outra estratégia da meta 20 que estabelece a criação do Custo Aluno Qualidade Inicial (CAQi) que deveria ser implementada também em junho de 2016. O CAQi prevê quanto deve ser gasto por aluno e garante que a União complementará caso Estados e municípios não tenham a verba necessária para financiar a educação.

“A ideia do CAQi é não só garantir condições financeira para viabilizar melhores condições de trabalho para o docente, mas também criar parâmetros vinculantes de carreira com coisas básicas como a diferença entre salário do início e do final da carreira. A ideia é criar uma perspectiva que dobre a remuneração do início ao fim da vida do professor”, comentou Salomão.

Aléssio Costa Lima reconhece que a meta não será cumprida no tempo previsto, mas avalia que ao contrário de outros objetivos, esse ponto teve avanços mais significativos. “O terreno está preparado para que se comece a cumprir efetivamente, em janeiro de 2017, com o início da revisão dos planos de carreira dos estados e municípios de uma maneira mais estruturada e orientada”, analisou.

Ele também reconhece, entretanto, que sem mais recursos a política de planos de carreira fica mais difícil de ser realmente efetivada e por isso é necessário reforçar que o PNE deve ser visto de maneira integral, pois as metas são articuladas e complementares.

O CAQí é considerado uma das principais propostas do PNE para financiar a educação.

O CAQí é considerado uma das principais propostas do PNE para financiar a educação.

#Estratégia 20.6 : Será implantado o Custo Aluno-Qualidade inicial (CAQi), referenciado no conjunto de padrões mínimos estabelecidos na legislação educacional e cujo financiamento será calculado com base nos respectivos insumos indispensáveis ao processo de ensino-aprendizagem e será progressivamente reajustado até a implementação plena do Custo Aluno Qualidade (CAQi).  

Prazo: junho de 2016

O Custo Aluno Qualidade Inicial (CAQi) é considerado pelos especialistas como uma das estratégias mais importantes do PNE. A previsão é que esse instrumento estabeleça um mínimo que deve ser gasto pelo Estado com cada aluno em toda a etapa de ensino.

Caberá a União complementar o orçamento dos Estados e municípios para que esse mínimo seja garantindo em todas as redes. Cálculos da Campanha Nacional pelo Direito à Educação estimam que essa medida sozinha injetará cerca de R$ 40 bilhões na educação.

Apesar de ser uma meta importante, também não será cumprida em 2016. Segundo Daniel Cara, o MEC tomou algumas posturas equivocadas em gestões passadas que estão atrasando o cumprimento.

A Campanha apresentou em 2008 um parecer sobre o CAQi que foi aprovado pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) em 2010. Em tese, ele deveria ter sido homologado ano passado, mas o MEC instituiu um comitê interno que tinha como objetivo rever o conceito do instrumento, o que acabou atrasando sua aprovação.

“Perdemos muito tempo em 2015 na disputa política porque estavam tentando reorientar o sentindo do CAQi, mas ele já estava muito consolidado. O resultado foi que não conseguiram desmontar o que estava previsto. Com isso perdemos muito tempo e não conseguimos dar andamento a esse instrumento central”, afirmou Daniel.

Segundo ele, a postura do atual ministro, Aloízio Mercandante, com a criação em março deste ano de outra comissão interinstitucional com vistas a implementar o CAQi é positiva. Daniel espera que as discussões avancem dentro desta comissão.

A própria portaria ministerial que estabelece o grupo prevê que ele trabalhará por dois anos, a partir de março de 2016, para definir a metodologia de implementação e propor mecanismos federativos de cooperação e colaboração para implementação do CAQi e do Custo Aluno Qualidade (CAQ), além do levantamento de fontes de financiamento para viabilizá-los.

“Essa comissão vai fechar o conceito, mas vai trabalhar já na perspectiva de viabilizar sua implementação. Estamos pagando o pato dos erros do passado. Por pressão da sociedade civil e sensibilidade do ministro de tentar resolver a pauta foi instituída essa comissão, mas quem mantém a coisa andando é a sociedade civil que fez com o que MEC percebesse agora que não dá para protelar”, afirmou.

SNE é outra meta que não deve ser cumprida a tempo por conta da crise política.

SNE é outra meta que não deve ser cumprida a tempo por conta da crise política.

Art. 13. O Sistema Nacional de Educação deverá ser instituído pelo poder público, em lei específica.   

Prazo: junho de 2016 

A criação de um Sistema Nacional de Educação (SNE) está previsto na Constituição Federal de 1988. Sua criação após 2 anos da data de publicação do PNE está presente no artifo 13 da lei aprovada em 2014. O intuito é definir quais são as responsabilidades de cada ente federado na educação.

Existem algumas propostas sobre o tema em trâmite no Congresso Nacional.  O deputado federal Ságuas Martins (PT/MT) fez uma primeira versão e o parlamentar Glauber Braga (PSOL/RJ) apresentou um projeto substitutivo. O Fórum Nacional de Educação também aprovou uma proposta.

Apesar disso, o tema não avançou e, diante da crise política, é improvável que seja aprovado até junho desse ano. “As metas do PNE não avançam por conta do ajuste fiscal e da crise econômica, mas também porque a crise política tem tomado toda a agenda e não abre espaço para que seja discutida qualquer outra coisa que não a crise. O resto dos debates acaba sendo secundarizado diante da atual polarização”, afirmou Daniel Cara.

Para Salomão, é absolutamente improvável que até junho deste ano o país consiga resolver o SNE. “O ritmo e a pauta do Congresso Nacional correm somente em torno da crise política e os outros temas estão sendo colocados em segundo plano. Até essa crise se resolver, dificilmente aprovaremos o SNE”, disse o professor da UFABC.

O Plano Nacional de Educação e o Sistema Nacional de Educação: educar para a equidade

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