Programa Vojo Brasil incentiva jovens quilombolas a falar sobre o cotidiano da comunidade
Publicado dia 19/11/2013
Publicado dia 19/11/2013
Iniciativa: Vojo Brasil -ampliando vozes quilombolas por meio do celular
Pública ou Privada: 3º Setor
Conhecida por ser um dos pontos turísticos de Salvador (BA), a Ilha de Maré, a 5 quilômetros de São Tomé de Paripe, subúrbio da capital, traz também a história africana enraizada em seu território, ocupado por nove comunidades quilombolas. Os mais de cinco mil moradores têm no mar sua maior fonte de sustento. A maior parte da população vive da pesca, do transporte marítimo, ou da coleta de mariscos, feita especialmente por mulheres quilombolas, chamadas de marisqueiras.
A tecnologia Vojo foi criada pelo projeto VozMob para ser utilizada por imigrantes da América Latina nos EUA e, em parceria com o Instituto Mídia Étnica, foi testada pela primeira vez com trabalhadoras domésticas brasileiras residentes em Boston.
Mesmo rodeada de indústrias, – petroleira e de portos -, a ilha ainda sofre pela falta de infraestrutura e descaso por parte do poder público. Em vez de melhorias, essas organizações acabam poluindo ainda mais as águas. Em alguns pontos, não existe sequer energia elétrica e o acesso à internet ainda não é uma realidade para todos. A partir desse contexto, em agosto de 2013, o Instituto de Mídia Étnica (IME), em parceria com o Center for Civic Media, do Massachusetts Institute of Technology (MIT- EUA), trouxe para a região a tecnologia Vojo, que possibilita a transmissão de informações sem precisar acessar a internet ou estar conectado a computadores.
A ferramenta permite que as pessoas enviem reportagens de áudio por meio de celulares ou telefones públicos de forma gratuita, apenas com o cadastro em uma central, utilizando a tecnologia Voz sobre IP (VOIP, que memoriza a voz humana em uma base de dados na internet) . Cada áudio é diretamente registrado no portal do projeto ou nas mídias sociais, como o Facebook.
Com quase oito anos de atuação, o Instituto Mídia Étnica (IME) é uma organização social que desenvolve projetos no campo da comunicação e diversidade e é responsável por diversos ações de comunicação comunitária e jornalismo cidadão, como o portal Correio Nagô (www.correionago.com.br).
As oficinas de formação duraram cerca de dois meses e contribuíram com a formação em comunicação de 20 jovens quilombolas das comunidades de Bananeiras, Martelo, Porto dos Cavalos, Maracanã e Praia Grande, todas situadas na ilha.
Os encontros falavam sobre o direito humano e democratização da comunicação, identidade negra, as questões de gênero, direitos sexuais e reprodutivos e contavam também com oficinas sobre o jornalismo destinado à internet e como realizar entrevistas utilizando o celular.
Com seus celulares, os participantes transmitiram informações acerca da cultura tradicional quilombola, assim como denunciaram problemas encontrados em seu cotidiano.
Mas, desde o início, a aproximação do IME com os jovens das comunidades só foi possível por meio da liderança quilombola local, que também elegeu quais seriam os participantes, no intuito de garantir que a tecnologia fosse multiplicada para toda a região.
Atualmente, os jovens continuam utilizando a tecnologia e as práticas em comunicação que aprenderam para falar sobre a Ilha de Maré.
Todos os jovens participantes da formação deram sequência à atividade e efetivamente vêm ensinando outros jovens a fazerem uso das ferramentas. A comunidade têm acessado a produção dos educandos e alcançou um canal de comunicação que efetivamente responde às características da cultura local.
A partir da ação de alguns jovens (veja o relato abaixo), a falta de transporte para escolas, problema social local, que antes passava desapercebida, chamou a atenção da prefeitura da região, que voltou atrás de uma decisão e retomou a política de mobilidade para os estudantes.
Atualmente, o objetivo do IME é ampliar a tecnologia a outros coletivos do país, como assentamentos ou regiões periféricas, por meio de um número 0800, que permita a utilização do Vojo em qualquer lugar do Brasil.
Fredson Santana de Bonfim, 20, está no segundo ano do ensino médio e é um dos jovens que receberam formação para utilizar o Vojo. Para chegar até a escola, ele acorda todos os dias às 5h30, toma um barco às 6h, que vai até o bairro de Cobalto, no município de Candeias (BA). De lá, ainda pega um ônibus para chegar à escola às 7h.
A trajetória de Fredson é uma realidade das meninas e meninos quilombolas da Ilha de Maré. Geograficamente distantes dos outros municípios, eles dependem do barco para chegar à escola. Em 2013, porém, a Prefeitura Municipal de Salvador deixou de disponibilizar o barco para a travessia para uma das comunidades da Ilha, fazendo com que estudantes tivessem que pagar um real para ir e voltar do colégio.
Já sensibilizados pelas oficinas de comunicação e prontos para utilizar a tecnologia Vojo, os estudantes retrataram o problema por meio de gravações e divulgaram em seus espaços na internet por meio dos celulares. A partir dessa denúncia, a prefeitura voltou a disponibilizar os barcos.
Para Fredson, a maior parte das emissoras que chegam até o local, falam apenas dos elementos ruins que compõem a comunidade, esquecendo-se dos pontos positivos e da cultura tradicional. Ele diz que, por meio da ferramenta, é possível transmitir outro olhar sobre a Ilha e atrair novos turistas, colaborando com a economia local. “Eu uso mais esse projeto pra fazer entrevistas sobre a realidade da minha comunidade; tudo que acontece eu faço entrevistas, sejam coisas boas ou ruins”.
Para o diretor executivo do Instituto Mídia Étnica, Paulo Rogério Nunes, responsável por trazer a ferramenta ao Brasil, um dos principais resultados é o empoderamento dos jovens na produção de conteúdo midiático sobre sua própria comunidade, o que aumenta a autoestima, já que eles percebem que também são capazes de produzir informação. “O direito à comunicação é fundamental e constitucional. Infelizmente, por questões econômicas e sociais, a maior parte das comunidade periféricas não têm acesso e não têm como exercer esse direito, pois a mídia é muito concentrada”.
Início e duração: De agosto a outubro de 2013, com continuidade até os dias atuais.
Local: Ilha de Maré – Salvador (BA)
Responsáveis: Instituto de Mídia Étnica
Envolvidos e parceiros: Center for Civic Media, do Massachusetts Institute of Technology (MIT)
Financiamento: Center for Civic Media, do Massachusetts Institute of Technology (MIT)
Contatos
Instituto Mídia Étnica
Telefones: (71) 9166-5403/9131-2516/8718-7156/
Facebook: Vojo Brasil – Ampliando Vozes Quilombolas por meio do celular E-mail: [email protected]/ [email protected] / [email protected]
Site: Correio Nagô