publicado dia 23/09/2015

Lei de responsabilidade educacional atrelada a exames de avaliação pode aumentar exclusão

Reportagem:

O Ministério da Educação (MEC) e diversas entidades estão preocupados com a possibilidade de que a Lei de Responsabilidade Educacional (LRE), que atualmente tramita na Câmara dos Deputados, seja aprovada. O dispositivo prevê punição de gestores públicos com base em resultados de provas como o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e a Prova Brasil.

Na avaliação do Secretário de Articulação com o Sistema de Ensino do MEC, Binho Marques, a medida pode gerar mais desigualdades dentro do sistema de ensino, pois estudantes com um desempenho menor nessas avaliações podem começar a ser excluídos do sistema para garantir que o desempenho da escola apresente melhora, evitando, assim, que o gestor seja punido.

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Binho Marques, Secretário de Articulação com o Sistema de Ensino do MEC

“A tendência é que as escolas se tornem menos inclusivas porque elas serão pressionadas a apresentar resultados e isso não acontece do dia para a noite. Um bom sistema de ensino inclui trabalhadores, crianças e jovens que estavam fora da escola, e isso, em alguns casos, segura o crescimento do Ideb. Mas isso não representa uma melhoria da educação? O gestor merece ser punido porque incluiu mais estudantes?”, questiona Binho.

A Lei de Responsabilidade Educacional é uma exigência do Plano Nacional de Educação (PNE) e deveria estar em vigor desde junho de 2015. Atualmente, existem 21 projetos que versam sobre o tema na Câmara dos Deputados.

A Casa criou, em 2013, uma Comissão Especial destinada a apresentar uma proposta sobre o tema. Raul Henry, ex-deputado federal e atual vice-governador de Pernambuco (PMDB), apresentou um relatório que acabou não sendo apreciado pelos outros parlamentares antes do final dos seus mandatos. Nessa nova legislatura, os deputados aprovaram a recriação da Comissão Especial.

O atual relator do projeto na Comissão Especial é o deputado federal João Carlos Bacelar (PTN-BA). Ele defende que a educação brasileira incluiu muitos estudantes nos últimos anos, mas que o sistema como um todo está falido do ponto de vista de qualidade. A solução, a seu ver, seria atribuir responsabilidades para poder superar esses problemas.

Segundo o deputado, avaliar e punir o gestor com base nos resultados de exames como a Prova Brasil e o Ideb não é método ideal, mas é o único instrumento do qual o Estado dispõe em suas mãos para realizar tal avaliação.

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Deputado Federal Bacelar (PTN-BA) é o novo relator da Comissão que discute a Lei de Responsabilidade Educacional

“O Ideb não é o melhor sistema de avaliação, mas é o que temos. Além disso, é o sistema que o Estado utiliza para medir o desempenho das nossas escolas, estudantes e professores”, afirmou.

Ele defende a punição de gestores que não cumprirem metas educacionais porque “quando me candidato, digo que a qualidade da educação vai retroceder? Quem é o responsável se não o poder público que foi eleito? Como nós vamos conviver com o grande número de falta às aulas de professores? Se eu sou gestor [público] posso abrir processos, advertir esses docentes que não estiverem indo”, afirmou o congressista.

Segundo Bacelar, a última audiência pública da Comissão será realizada em 30 de setembro e, em novembro, deve ser aprovado um texto base que será remetido ao plenário da Câmara.

Para o presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e dirigente municipal de Educação de Tabuleiro do Norte (CE), Alessio Costa Lima, é um grave erro metodológico punir gestores com base no Ideb e na Prova Brasil porque elas foram pensadas para diagnosticar o cenário educacional e não para punir aluno e professor.

“Nada contra o processo de monitoramento e responsabilização do gestor, mas atrelar a responsabilidade dele ao resultado do Ideb e da Prova Brasil é uma desvirtuação da avaliação porque elas foram pensadas para diagnosticar e intervir e não para punir; caso seja aprovada essa legislação, será um erro técnico e um equivoco do ponto de vista pedagógico”, afirmou.

Para Binho Marques o resultado do Ideb não guarda necessariamente uma relação com a qualidade do ensino. “O Ideb foi um passo importante, mas uma escola e uma cidade quem tem bom o Ideb não é resultado somente do esforço do gestor. O Inep tem mostrado que o Ideb está mais relacionado a nível social da cidade do que a qualidade do sistema”, afirmou.

Para o Secretário de Relações Educacionais da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo Filho, avaliar um gestor com base em resultados de provas é insuficiente porque eles não avaliam o todo do processo.

“O Ideb é insuficiente para cuidar da avaliação da educação básica porque ele tem foco só em duas disciplinas (matemática e português) e cuida só da taxa de aprovação, sem levar em conta o processo de ensino”, criticou.

Órgão fiscalizador

Outra medida defendida pelo deputado Bacelar é a criação de um órgão composto por sindicatos, associações de pais, clubes de serviços, associações comerciais e outras entidades da sociedade civil que seria responsável por fiscalizar a educação brasileira.

Seus objetivos seriam acompanhar o cumprimento das metas dos Planos estaduais e municipais de educação e, assim, fiscalizar os resultados apresentados pelos gestores públicos.

“Esse órgão seria independente da máquina do Estado e acompanharia o desenvolvimento da educação brasileira. Ele seria um desaguador natural dos anseios da população. Uma mãe cujo filho, aos 10 anos, ainda não sabe nem ler nem escrever pode se queixar a quem?”, afirmou o deputado.

Para Binho Marques essa proposta não resolveria o problema da educação brasileira. Para ele, já existem muitos mecanismos reguladores. “Não adianta querer resolver o problema da educação no Brasil criando grandes programas e mais uma instância, quantos programas e projetos que são até mesmo contraditórios existem? Precisamos de uma visão mais sistêmica”, afirmou.

De acordo com Binho, essa visão mais sistêmica passa pela aprovação do Sistema Nacional de Educação (SNE), que irá organizar as estruturas, instâncias e procedimentos que hoje estão desconexos. O PNE prevê que o SNE tem que ser aprovado até junho de 2016.

“Precisamos olhar o que já existe hoje, ver o que funciona e o que não funciona, o que precisa ser fechado e o precisa ser criado. Tudo isso tem que ser feito de maneira articulada e coerente porque o que temos hoje é um excesso de fragmentação”, afirmou Binho.

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