publicado dia 26/05/2025

Afastamento de diretores escolares em São Paulo (SP) gera críticas e mobilização de comunidades

Reportagem: | Edição: Tory Helena

🗒️Resumo: Atos, mobilizações e críticas foram realizados por educadores, estudantes e comunidades escolares após o anúncio do afastamento de diretores na rede pública municipal de São Paulo (SP). Para especialistas, medida é autoritária e fere a autonomia escolar. 

Comunidades escolares se mobilizaram após o afastamento de 25 diretores de escolas públicas municipais de São Paulo (SP). Entre as escolas afetadas pela intervenção da Secretaria Municipal de Educação (SME), estão referências no trabalho com a Educação Integral, como a EMEF Espaço de Bitita

A escola atende 750 estudantes do Ensino Fundamental e Educação de Jovens e Adultos (EJA) na região do Canindé. Metade das crianças e adolescentes recebidos pela escola são negros, 25% refugiados ou imigrantes e 10% vivem em centros de acolhida da região. Apesar do contexto desafiador, a escola é reconhecida pelo trabalho pedagógico democrático, inclusivo e conectado ao território. 

Escola referência em Educação Integral é afetada pela intervenção

Emef Espaço de Bitita

Espaço de Bitita: o trabalho coletivo é marca da escola.

Crédito: Patrick Silva/Alma Preta

Na EMEF Espaço de Bitita, o protesto pacífico em favor da permanência do atual diretor reuniu aproximadamente 150 pessoas, entre professores, familiares dos estudantes, ativistas e manifestantes contrários ao afastamento. O grupo se reuniu em frente à escola na manhã da segunda-feira (26/05).

Dentro dos muros baixos da escola, os estudantes do Ensino Fundamental uniram-se ao ato, levantando cartazes escritos em Português e Espanhol que mesclavam críticas (“Prefeito, tire a mão da minha escola!”), pedidos de Justiça e mensagens afetivas (“Nessa escola eu consegui amigos, respeito e o meu direito” e “Eu amo a minha escola do jeito que ela é”) desenhadas em cartolina.

Cartazes em protesto contra o afastamento de diretores em São Paulo na Emef Espaço de Bitita

Estudantes engajaram-se no ato erguendo cartazes com mensagens afetivas, críticas e pedidos de Justiça.

Crédito: Nataly Simões/Aprendiz

Engajadas, as crianças também cantaram em grupo músicas que reforçam a diversidade e homenagearam a escritora Carolina Maria de Jesus, que viveu na região do Canindé, além de gritarem “Cláudio Fica!”.

Referência na prática da Educação Integral, a escola é reconhecida pelos projetos pedagógicos democráticos, inclusivos e currículo crítico. O espaço também atende uma população de estudantes migrantes e refugiados, além de crianças com deficiência e que vivem em Centros Temporários de Acolhimento (CTA).

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Por seu trabalho de inclusão e promoção do Direito à Educação, a escola já recebeu prêmios como o “Criativos da Escola”, “Faz a Diferença” do grupo Globo, “Professor Nota 10” da Fundação Victor Civita, além de integrar as escolas associadas da Unesco.

Protesto contra o afastamento do diretor da EMEF Espaço de Bitita

Cartazes afixados na porta da EMEF Espaço de Bitita na manhã da segunda-feira (26/05)

Crédito: Nataly Simões/Aprendiz

O afastamento do diretor, Cláudio Marques da Silva Neto, surpreendeu a comunidade escolar e os professores. Coordenador pedagógico, Carlos Eduardo Fernandes elogiou o trabalho do gestor escolar. “É um profissional que luta todos os dias para colocar todo mundo para dentro da escola”, disse. 

“Como eu faço para alfabetizar quem chega a todo tempo? Como eu faço para acolher quem estava na rua até ontem? Essas são dimensões do nosso trabalho que precisam ser evidenciadas. Não faz sentido resumir o trabalho da escola a uma única nota”, avaliou o educador. 

Protesto contra o afastamento do diretor da EMEF Espaço de Bitita (6)

Com apresentação musical e cartazes, estudantes participaram de ato contra a mudança na gestão da EMEF Espaço de Bitita.

Crédito: Nataly Simões/Aprendiz

Cartazes em manifestação contra o afastamento do diretor da EMEF Espaço de Bitita.

Cartazes confeccionados em português e espanhol por estudantes da EMEF Espaço de Bitita. Conhecida pelo trabalho com a diversidade, 25% da escola é composta por alunos migrantes ou refugiados.

Crédito: Nataly Simões

Estudantes e familiares pedem permanência dos diretores afastados 

Na EMEF Caio Sergio Pompeu de Toledo, na Zona Leste, a notícia do afastamento do diretor pela Prefeitura foi recebida com revolta e tristeza pelos estudantes, que fizeram uma homenagem ao atual diretor na sexta-feira (23/05). Ele foi aplaudido pelos presentes no ato, que carregavam cartazes com dizeres como “Isso não é justo” e “Não vai embora”. 

Mãe de três estudantes de outra escola afetada pela intervenção, a Emef Ibrahim Nobre, Tawany Siqueira do Nascimento criticou a medida no artigo “Aqui fala uma mãe: não tirem o nosso diretor”

“Não queremos um interventor na escola! Todos nós da comunidade conhecemos e sabemos como o Leonardo [Manini, diretor da escola] conhece nossas crianças e adolescentes e isso tem que permanecer. Chega de arbitrariedade contra a população, contra quem sabemos que cuida dos nossos direitos dentro da escola e sabe cuidar dos alunos, professores, faxineiros, pais e todos ao redor”, escreveu. 

As escolas EMEF Vinicius de Moraes, EMEF Mário Lago e CEU Tiquatira também registraram convocação de protestos. 

Entenda o caso do afastamento de diretores escolares em SP 

O anúncio, feito na última sexta-feira (23/05), pegou estudantes, professores e gestores escolares de surpresa e causou comoção entre educadores, especialistas e ativistas. A justificativa seria a participação em “requalificação intensiva” promovida pela SME.

O desempenho da escola no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2023, além do tempo de atuação do gestor escolar, foi apresentado como critério pela gestão municipal. Com turmas de Ensino Fundamental, muitas das escolas estão localizadas em regiões vulnerabilizadas. 

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Os atuais auxiliares de direção assumirão a gestão das escolas afetadas, com indicação de outros profissionais (pela respectiva Diretoria Regional de Educação) para a posição de auxiliar. 

A retirada dos diretores faria parte de um plano de “requalificação” promovido pela gestão do prefeito Ricardo Nunes até o final do ano letivo. 

“A capacitação, inédita, inclui vivência em outras unidades educacionais e tem como objetivo o aprimoramento da gestão pedagógica para melhorar a aprendizagem de todos os estudantes”, afirma o site oficial da SME. 

A ação está prevista no Programa Juntos pela Aprendizagem, instituído em 25 de abril, durante a greve de professores na rede municipal. 

Afastamento de diretores escolares gera comoção e protestos 

Protesto de estudantes contra o afastamento de diretor na EMEF Caio Sérgio

Estudantes seguram cartazes em protesto contra o afastamento do diretor na EMEF Caio Sérgio.

Crédito: Reprodução/Instagram

O Ministério Público de São Paulo (MPSP) pediu esclarecimentos à SME, solicitando explicações, em até cinco dias, sobre os motivos do afastamento dos diretores escolares municipais. A solicitação, feita no mesmo dia do anúncio da intervenção, é uma resposta à representação de vereadores, que buscam a anulação da medida. 

Na terça-feira (27/05), está prevista também uma roda de conversa com diretores afastados no Auditório da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP). 

Além de parlamentares, sindicatos e ativistas pelo Direito à Educação, organizações da sociedade civil e especialistas também se manifestaram contra a resolução da gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) e do secretário da pasta, Fernando Padula. 

Em nota pública, o Geledés – Instituto da Mulher Negra manifestou solidariedade aos educadores afastados e pediu para que o processo seja interrompido. 

“Destacamos que as escolas sob intervenção estão localizados, em sua maioria, em territórios vulnerabilizados pela escassez de investimentos e equipamentos públicos nas localidades, sob constantes situações de violências e violações, e as escolas em questão cumprem com o importante compromisso de elaborarem um projeto político pedagógico que valorizam a diversidade étnico-racial e dialogam com a comunidade escolar para a realização de ações coletivas, comprometidas com a formação para a cidadania”, afirma o texto da nota. 

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Para Helena Singer, especialista em Educação e socióloga, o uso do Ideb como justificativa para o afastamento distorce o objetivo da avaliação

“Só o Ideb não é suficiente para avaliar a qualidade da Educação ofertada nas escolas, ele não mede todo o contexto. Por exemplo, unidades que vivem um grande fluxo de estudantes que migram ao longo do ano não tem como performar bem na prova, mas isso não diz da qualidade da escola e isso o Ideb não mostra”, analisa a socióloga. 

“E se os diretores precisam de formação, eles deveriam realizá-la no exercício de sua função, no contexto da escola acontecendo, com a equipe envolvida no processo de superação do suposto problema que ela tem”, defende Helena. 

Afastamento de diretores escolares em São Paulo (SP) impõe retrocessos para a rede, alertam educadores

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