publicado dia 27/08/2013

A importância de políticas públicas articuladas na implantação da Educação Integral

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A virada do século XX para o XXI coincidiu com novos modelos de arranjos sociais. Desde os anos 2000, os territórios virtuais vêm se ampliando e fazendo da Internet um espaço de troca de conhecimento e compartilhamento de experiências. São diversos links e hiperlinks que levam, a todo o momento, à conexão de informações, formando uma verdadeira teia de saberes.

Diante dessa nova configuração que se inicia no espaço cibernético, os espaços físicos e presenciais também começam a assumir novas configurações, no intuito de caminhar junto a essas outras formas de estar no mundo. O trabalho em rede e de maneira articulada começa a se tornar crucial para a resolução das demandas da sociedade contemporânea, o que envolve, principalmente, novas formas de pensar as políticas públicas sociais que podem transformar um cenário formado ainda por muitas desigualdades. Assim, é preciso que aquilo que acontece no espaço cotidiano não esteja dissonante das potencialidades que o mundo virtual oferece.

Para a diretora de Currículos e Educação Integral da Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação (SEB-MEC), Jaqueline Moll, na atual sociedade do conhecimento, os saberes vão se tornando cada vez mais complexos, com o aparecimento de artefatos tecnológicos, fazendo com que a escola se torne o espaço de integração. “A escola é onde esses saberes devem ser apropriados pelo sujeito, que, muitas vezes está fora desse circuito”, afirma.

Assim, é importante pensar novas formas de ordenar a educação do país, mostrando que esse desafio é de todos os cidadãos. Desse modo, no âmbito da Educação Integral, essa articulação em rede não pode ser diferente, uma vez que o propósito é trabalhar toda a integralidade da pessoa humana, dando sentido aos ensinamentos e aprendizados  presentes em todos os atores da sociedade.

É evidente o papel dos órgãos governamentais voltados à educação na construção de políticas públicas para garantir o direito de crianças e adolescentes a uma educação de qualidade. No entanto, apenas esses órgãos e a escola, enquanto polo central dessa construção, não são suficientes para responder a todas essas demandas.

Para a secretária de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) do Ministério da Educação, Macaé Evaristo, é importante reorganizar o desenho das políticas públicas em âmbito nacional para que isso inspire também os outros entes federativos. “Quando um programa se constrói intersetorial a partir do Governo Federal, isso se torna um exemplo no âmbito dos estados e municípios, fazendo com que os gestores também busquem uma gestão intersetorial em suas próprias áreas de atuação”, aponta.

Desse modo, políticas públicas formuladas de forma intersetorial são um dos meios de se concretizar aquilo que já está contido no Artigo 205 da Constituição Federal de 1988, que aponta a educação como um dever do Estado e da família, promovida e incentivada com a colaboração de toda a sociedade.

Assim como mostra a Carta Magna, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) também sinalizam a responsabilidade pela educação e por demais direitos de forma compartilhada.  Esses marcos legais já apresentam a importância de garantir a integralidade de crianças e adolescentes, mas para a secretaria de educação de São Bernardo do Campo, Cleuza Repulho, uma política de Educação Integral interligada só é possível se houver vontade por parte do prefeito, que deve contemplar em seu plano de governo  a efetivação da Educação Integral.

“Os secretários devem saber as dimensões desse plano e estar alinhados ao Plano de Governo e o secretário de educação deve garantir que a educação integral faça parte do currículo daquela rede”, complementa Repulho, que também é presidenta da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime).

“Não é preciso inventar nada, apenas utilizar os recursos já existentes”

Para Repulho, um dos maiores desafios da gestão pública, tanto em nível municipal quanto em nível estadual é trabalhar com diversas secretarias na perspectiva de um único atendimento.  “A educação integral precisa dessa interação. Não se pode sobrecarregar o secretário de educação. Portanto, o prefeito tem um papel importante de determinar a matricialidade e chamar as secretarias e construir as  políticas complementares”.

De acordo com o texto Gestão Intersetorial no Território, da Série Mais Educação do MEC, mesmo a gestão pública aparecendo de forma descentralizada desde a Constituição de 1988, que deu mais autonomia a estados e municípios, as políticas sociais ainda funcionam de forma isolada. “Planejamentos, orçamentos, normatizações técnicas, recursos humanos, enfim, todo o modelo de gestão é organizado e operado, via de regra, em função do grau de especialização e profissionalização de cada área”, aponta a publicação.

O mesmo estudo mostra que, antes mesmo de se construir uma política conjunta, os secretários de um município devem repensar o foco dessa política e, assim, criar metas que norteiem o trabalho de forma coletiva.

Para Repulho não é necessário inventar elementos novos, mas sim realizar uma articulação entre ações que já existem. “Um dos grandes desafios é encontrar a melhor forma de com o mesmo recurso atender mais e melhor, otimizando o que já existe e falando com novas secretarias”.

Nova Iguaçu, um bairro educador

Foi exatamente isso que fez o município de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense (RJ), em 2006. Não havendo recursos suficientes para a construção de novas escolas no processo de ampliação do tempo escolar e implantação de uma Educação Integral, o município passou a utilizar espaços existentes na comunidade.

As ruas se encheram de novos significados. As praças e até os espaços privados se tornaram educativos.  A Prefeitura Municipal intensificou a fiscalização de ruas comerciais, onde os lojistas deixaram de expor seus produtos nas calçadas, para torná-las também espaços livres para o aprendizado.

A existência de uma Secretaria de Participação Popular colaborou para integrar as políticas educacionais às próprias políticas sociais, já que a partir dela foi possível realizar um levantamento dos equipamentos públicos e privados, das diversas lideranças comunitárias, e, assim, construir uma rede de parceiros capaz de tornar o bairro escola uma realidade.  Hoje, embora o programa tenha mudado seu desenho original, toda a rede municipal do município, composta por mais de 100 escolas, estão contempladas no programa de Educação Integral.

Mapeamento e Diagnóstico de área

Esse tipo de mapeamento é extremamente importante no processo de construção de uma política integrada.  Assim, é possível reconhecer a situação educacional do município e também suas potencialidades e necessidades.

Da mesma forma é fundamental que a gestão invista em diagnósticos da realidade local. Para isso, existem índices, taxas e indicadores, que apontam as demandas dos municípios, permitindo a criação de referências locais. Exemplos deles é  o Ideb (Índice da Educação Básica), o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e o Censo Escolar.

Para a secretária Macaé, pode ser interessante também construir um mapeamento a partir da leitura da população, trabalhando a ideia de cartografia participativa, na qual professores e estudantes possam opinar. “Costumo dizer que a  melhor maneira de um diretor de escola, por exemplo, saber o que existe no entorno de sua comunidade é se aproximar dos próprios estudantes. Os jovens e adolescentes conhecem muita mais a sua comunidade do que até mesmo os profissionais da escola ou gestor pedagógico”, diz.

Nesse sentido, um aprofundamento da história local também é válido. É o que mostra Cleuza Repulho sobre a implantação do Programa de Educação Integral do município de São Bernardo do Campo (SP), o Tempo de Escola, que utilizou a prática de skate como um processo educativo, já que a cidade tem um histórico de atletas na modalidade. “As experiências que conhecemos pelo Brasil que efetivamente fizeram a diferença, têm na Educação Integral uma ligação e uma conexão importante com o dia a dia na sala de aula. Os professores incorporam isso como modelo de aprendizagem e o pessoal que trabalha com a educação integral interage no dia a dia com as escolas” afirma.

Flexibilidade na gestão e continuidade do projeto

Além disso, como aponta a publicação Gestão Intersetorial no Território é preciso haver também contínuo esforço de negociação, planejamento e flexibilidade de gestão para a entrada de novos parceiros, permitindo  que os planejamentos se configurem a partir dos resultados alcançados.

“O desenho [da política] de educação integral deve trazer flexibilidade, é pouco provável que um único desenho ou arranjo dê conta das diversidades que temos em nossso país, quer seja pra garantir as diferenças geracionais numa proposta quer seja para trabalhar o próprio local de origem e nascimento”.

Planejamento

O planejamento se faz a partir da produção de informações, participação popular, enxergando a educação além dos muros da escola, como algo que pode permear e gerar identificação em todos da sociedade. Um exemplo de participação popular a qual o secretário deve se atentar são as deliberações das conferências nacionais de Educação, Assistência Social, Direitos da Criança e do Adolescente e Cultura.

Por fim, Macaé explica que uma política para crianças em uma comunidade ribeirinha, por exemplo é distinta de uma política de educação integral para estudantes na área urbana. “O gestor deve ter uma percepção muito clara da população com a qual ele está trabalhando e como ver as potencialidades que estão em seu território,  para partir para um diálogo com diferentes sujeitos e os seus territórios”.

 

 

 

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