publicado dia 05/09/2016

Livro resgata cartas trocadas entre Paulo Freire e sua prima quando criança

Reportagem:

“…do mesmo jeito que para chegar à casa eu tinha que passar por muitas ruas, para chegar às cartas eu preciso atravessar as lembranças…” (Nathercia)

E, inesperadamente, como um passageiro que senta à janela de um ônibus e vai, atento, a um destino ainda desconhecido e começa a sua viagem. Entre um leve sacolejar passam diante de seus olhos ruas, casas, fotos, álbuns antigos, memórias, pessoas, flores, frutas e mais memórias. O destino final!? A infância de Nathercinha.

Paulo Freire ao lado de Lutgardes, o "Tutu" . Créditos: divulgação

Paulo Freire ao lado de Lutgardes, o “Tutu” . Créditos: divulgação

Esse resgate acontece pela própria Nathercia, com a ajuda das amigas Cristina e Denise, que descobrem que o ser paleontóloga e o ser arqueóloga, respectivos sonhos de infância, encontram vasto campo de escavação entre as memórias. E elas escavam, remexem, relembram por um único e grande motivo: foi Nathercinha que, aos nove anos de idade, começou a se corresponder com o primo, Paulo Reglus Neves Freire, o conhecido Paulo Freire.

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Foram ao todo seis cartas trocadas de 1967 a 1969 no momento em que Paulo se encontrava exilado no Chile, Estados Unidos e Suíça e a pequena Nathercinha nem sequer desconfiava o que isso significava, embora sentisse falta da presença do primo na casa de seu avô Lutgardes, o “Tutu”, no bairro da Urca, Rio de Janeiro.

Créditos: divulgação

Carta de Paulo Freire enviada a Nathercinha. Créditos: divulgação

Entre os escritos, Paulo Freire sempre situava a menina por entre as paisagens do Chile, ora nevadas, ora nem tanto. E a permitia enxergar a cor da casa azul onde morou por um tempo. Maneira bastante particular de se corresponder com a mente criativa da garota, pronta para descobrir o mundo, cheia de curiosidade.

E também uma forma de convidá-la a não se distanciar da infância, condição essencial para Freire. “É uma coisa boa Nathercinha, que a gente nunca deixe de ser menino. Os homens atrapalham as coisas, complicam tudo. (…) Cresça, mas nunca deixe de morrer em você a Nathercinha de hoje…”, grafou Freire na primeira correspondência.

E assim ele seguiu por entre outras folhas escritas a mão, sempre evidenciando a sua função de educador dentre as tantas outras que acumulava, marido, pai, primo. A mensagem não só foi assimilada como ganhou espaço em uma carta que Nathercia escreve a Paulo Freire, já adulta, dizendo de seus ensinamentos no século XXI.

Capa do livro A Casa e o Mundo lá fora. Créditos: divulgação

Capa do livro “A Casa e o Mundo lá fora”. Créditos: divulgação

“A menina que você conheceu segue comigo com vivacidade. Em meu trabalho com crianças, o que mais gosto é de peraltar brincadeiras e histórias em escolas, praças, ruas, pátios, quadras, chão de terra, de areia, de grama, de cimento e de asfalto, junto com muitas gentes: amigos de caminhada, crianças, professores, famílias, mais velhos (que guardam saberes aprendidos na lida dos dias), quilombolas, caiçaras, indígenas…Muitas gentes!”

O livro “A Casa e o Mundo lá Fora” é uma publicação da Zit Editora, e leva as assinaturas de Cristina Laclette Porto e Denise Sampaio Gusmão, que atuam na formação de professores de educação infantil no Pró-Saber e na PUC-Rio.

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