Reportagens

Educação Inclusiva depende de investimento e políticas públicas intersetoriais

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A Educação Inclusiva tem a potencialidade de melhorar a qualidade da educação para todos os estudantes, não apenas as crianças e adolescentes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e superdotação/altas habilidades, e é uma conquista recente no Brasil. Contudo, ao invés de ser ampliada e fortalecida, nos últimos anos a perspectiva da inclusão na Educação vem sofrendo ataques.

Diante disso, a Agenda 227 propõe: “Desenvolver e implementar medidas de enfrentamento à cultura de segregação escolar dos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e superdotação/ altas habilidades, com o objetivo de garantir sua inclusão em classes comuns com qualidade e condições de permanência. As ações devem envolver investimento público em formação de professores, recursos de acessibilidade e tecnologia assistiva, profissionais de apoio e oferta de Atendimento Educacional Especializado complementar”, diz a proposta 7.


O especial Educação no Centro do Debate — Eleições 2022 analisa em profundidade as 10 propostas para a Educação do Plano País Para a Infância e Adolescência com a participação de membros da Agenda 227, movimento apartidário que elaborou o documento. A Agenda 227 é composta por mais de 300 organizações da sociedade civil que vislumbram no processo eleitoral a oportunidade de colocar os direitos de crianças e adolescentes em foco no debate público e nos planos de governo.


A medida é importante para não retroceder na perspectiva da inclusão de todos no contexto educacional e na vida em sociedade. Historicamente, as pessoas com deficiência sempre viveram excluídas da sociedade, escondidas dentro de suas casas pelos familiares ou institucionalizados por toda a vida. Quando a sociedade começou a incluí-los, foi em situação de segregação: estavam ali, mas não faziam parte efetivamente. Isso é expresso, ainda hoje, em instituições de ensino voltadas exclusivamente para pessoas com deficiência, por exemplo, ou mesmo em escolas regulares em que os estudantes com deficiência não participam das mesmas atividades que o restante da turma. 

Em 2006, um avanço: foi aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. “Com isso, saímos de um modelo médico, que foca no impedimento e no CID que a pessoa tem, e passamos para o modelo social da deficiência, isto é, a responsabilidade do Estado, da política pública e de todas as pessoas de remover barreiras para que todos possam conviver em sociedade”, explica Luiza Corrêa, coordenadora de advocacy do Instituto Rodrigo Mendes.

Na Educação, este já era um direito garantido pela Constituição Federal aos estudantes com deficiência, mas que ganhou força sobretudo após 2007, com a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. De acordo com o Censo da Educação de 2021, a matrícula de estudantes com deficiência em escolas e classes comuns passou de 54%, em 2008, para 92%.

“Apesar do Brasil ter avançado muito na inclusão nos últimos 30 anos, é uma conquista recente, um direito pouco consolidado e, por isso, qualquer mobilização contrária tem impacto”, alerta Luiza.

Em 2020, o governo de Jair Bolsonaro publicou o decreto nº. 10.502, instituindo a Nova Política de Educação Especial, que estimulava estudantes com deficiência, transtornos do desenvolvimento e altas habilidades a frequentarem salas e escolas especiais. Embora a União não possa obrigar estados e municípios a aderirem ao modelo, o governo previa recursos financeiros e apoio técnico às redes que o implementarem. A sociedade civil se mobilizou e o Supremo Tribunal Federal declarou o decreto inconstitucional. 

“Ainda que não vigente, a política teve impacto porque é uma ideologia do atual governo. Em 2021 foi a primeira vez em dez anos que vimos aumentar as matrículas em escolas especiais. Precisamos urgentemente retomar o caminho que o Brasil seguia antes disso”, afirma Luiza.

Para Beatriz Benedito, analista de políticas educacionais do Instituto Alana, também preocupa a tramitação no Congresso Nacional da regulamentação da educação domiciliar, também conhecida como homeschooling, que pode impactar negativamente todas as crianças e adolescentes, em especial, as com deficiência.  

“É preciso garantir que as crianças e adolescentes com deficiência estejam na escola e que essa experiência seja importante para elas, enquanto sujeitos, e para quem está com elas. Quando essa relação acontece, temos um ambiente cidadão e democrático que fortalece os processos educacionais”, explica a especialista. 

O que é a educação inclusiva na prática

Uma pesquisa do Instituto Rodrigo Mendes e da Fundação Lemann, mostra que professores recebem e incentivam a presença dos estudantes com deficiência nas salas comuns. Do total de educadores, 86% responderam que educação inclusiva é melhor – 70% para todos e 16% para o estudante com deficiência. 

Já um estudo realizado pelo Instituto Alana, traz a percepção de 76% das pessoas concordam que quando crianças e adolescentes com e sem deficiência podem conviver juntos, todos ganham, e 86% afirmam que as escolas se tornam melhores ao incluir crianças com deficiência.

“É importante ressaltar que as pessoas querem que a inclusão aconteça e veem os benefícios. Mas também sabemos que muitas realidades não são assim, daí a importância de uma política pública que considere esses estudantes e efetive seus direitos”, pondera Beatriz.

Para que a inclusão aconteça nas escolas, a garantia da matrícula é o primeiro passo, mas é preciso cuidar também da permanência, da aprendizagem e da participação plena e em condições de igualdade em relação aos demais estudantes. 

“Todos os profissionais precisam ser formados em educação especial na perspectiva inclusiva, o que é fundamental para romper com a barreira atitudinal provocada pelo capacitismo, um viés inconsciente que leva as pessoas a acreditarem que a pessoa com deficiência não é sujeito de mesmos direitos. Estudantes com deficiência também aprendem, ensinam e se desenvolvem”, diz Luiza.

A especialista explica que também é preciso remover as barreiras que as escolas possa ter a fim de que todos e todas possam participar plenamente, como barreiras arquitetônicas, instalando rampa, elevador, sinal sonoro e piso tátil, comunicacional, com intérprete de Libras o tempo todo, ensino de Libras para todos, recursos de tecnologia assistiva, e metodológica, ou seja, que os métodos de ensino levem em consideração que cada pessoa, com ou sem deficiência, aprende de um jeito diferente. 

Dentre as escolas brasileiras, 60% não têm qualquer medida de acessibilidade arquitetônica (INEP/MEC, 2020).

Beatriz também reforça a necessidade de fortalecer a educação inclusiva na formação inicial, cuidar para que não apenas os materiais didáticos, mas também os de literatura e outras linguagens artísticas, bem como os esportes, sejam acessíveis, e que o transporte escolar seja garantido.

“O único jeito de garantir tudo isso é com investimento e políticas públicas intersetoriais. O Estado precisa ter como meta que 100% das crianças e adolescentes com deficiência estejam matriculados em escolas comuns porque é um direito desses estudantes e porque a educação inclusiva beneficia a todos. A formação cidadã se dá no encontro da diversidade – de gênero, raça, renda, corpos – e a presença do estudante com deficiência desestabiliza o sistema de ensino, mostra as lacunas para levar às evoluções, para compreender que todos e todas têm potências e desafios”, afirma Luiza.

Confira abaixo as reportagens que analisam em profundidade cada uma das 10 propostas para a Educação do Plano País para a Infância e a Adolescência da Agenda 227:

Proposta 1: Pacto Federativo no Sistema Nacional de Educação (SNE)

Proposta 2: Direito à Educação e ao Desenvolvimento Pleno

Proposta 3: Oferta de matrículas, acesso e permanência

Proposta 4: Financiamento

Proposta 5: Valorização dos profissionais da Educação

Proposta 6: Gestão democrática e participativa

Proposta 8: Educação com equidade étnico-racial

Proposta 9: Educação do Campo

Proposta 10: Educação Integral

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