A valorização da cultura imaterial é uma poderosa forma de conexão dos alunos com o seu território. Buscar diferentes estratégias para incorporar os saberes locais à escola contribui para a preservação e difusão da cultura imaterial, ou seja, desse conjunto de conhecimentos que não são ensinados formalmente nos livros, mas transmitidos de forma prática, de geração para geração. São exemplos de cultura imaterial: manifestações artísticas (música, dança, teatro), aspectos religiosos, objetos construídos artesanalmente, bem como costumes e práticas tradicionais locais.
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A cultura imaterial é um conceito amplo que abarca, também, o patrimônio imaterial. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) denomina como patrimônio cultural todas as expressões criadas pela sociedade que, com o tempo, são agregadas às das gerações anteriores. Esse conceito, hoje, estende-se a imóveis particulares, trechos urbanos e até ambientes naturais de importância paisagística, além de imagens, utensílios e outros bens palpáveis: o chamado patrimônio imaterial.
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A luthieria é uma manifestação artística que engloba a construção e restauração, de modo artesanal, de instrumentos de corda, com o objetivo de preservar e difundir a cultura imaterial local. A iniciativa é uma das ações do projeto Conexão Felipe Camarão, realizado pela Associação Companhia Terramar, na comunidade de Felipe Camarão – bairro da zona oeste de Natal (RN).
Trata-se de uma iniciativa que ensina jovens a partir de 16 anos a construir e restaurar, de forma artesanal, a rabeca, que é um instrumento precursor do violino. Com o oferecimento de oficinas de musicalização para crianças e jovens de 5 a 24 anos, constatou-se que a escassez do instrumento na região. A partir disso, desenhou-se uma ação que integrasse as pontas desse sistema: a produção, ensino e manutenção da rabeca, capaz de dar perenidade à preservação desta arte.
O projeto se fundamenta na cultura de tradição oral e na preservação de patrimônios imateriais locais, como o Auto do Boi de Reis, do Mestre Manoel Marinheiro (in memoriam); o Teatro de Bonecos de João Redondo, do Mestre Chico de Daniel (in memoriam); a Musicalização do Mestre Cícero da Rabeca (in memoriam); e a Capoeira, do Mestre Marcos.
Como forma de sensibilização sobre a importância da rabeca para a cultura local, foram realizados Círculos de Cultura em oito escolas do bairro de Felipe Camarão, que atendem aproximadamente 8 mil alunos. Os Círculos são rodas de conversa para aprendizagem coletiva sobre determinado tema. O convite inicial foi para os professores de Artes, mas, posteriormente, estenderam-se a professores de diversas outras disciplinas e à comunidade em geral.
Para sensibilizar os alunos, potenciais participantes das oficinas, foram realizadas apresentações de rabeca durante o período do recreio, de forma que pudessem entrar em contato direto com o instrumento e sua melodia.
Além de professores, alunos e comunidade, também foram envolvidos a Universidade Federal do Rio Grande do Norte, o Instituto do Cérebro e o Instituto Federal do Rio Grande do Norte. Tais instituições participam do projeto de diferentes formas, desde o incentivo à realização de pesquisas acadêmicas sobre música e cultura popular por parte dos alunos até o oferecimento de cursos e oficinas em parceria com a Associação.
Além da luthieria, há oficinas de Auto de bois-de-reis, musicalização de rabeca, percussão, flauta doce, capoeira e matrizes africanas, diversidade cultural brasileira, comunicação e cultura digital, adereços e figurinos, metais e berimbaus, além de círculos de cultura, rodas de prosa e cortejos de tradição. O projeto realiza, também, o evento Conexão Brasil, que integra as várias atividades e converge os patrimônios imateriais da comunidade de Felipe Camarão em um ato de celebração da diversidade cultural brasileira.
Escola Estadual Indígena Tuxaua Luiz Cadete
O território e a comunidade são as principais fontes de saberes da Escola Estadual Indígena Tuxaua Luiz Cadete, localizada em Cantá (RR). Nestes espaços, os estudantes aprofundam seus conhecimentos sobre a cultura da comunidade, conversando com as pessoas mais velhas e conhecendo locais e histórias que marcam o lugar onde estão.
O currículo também é pensado para fortalecer esse vínculo com a história da comunidade. Os estudantes de Ensino Médio têm aulas de medicina tradicional indígena com as pessoas mais experientes, que conhecem o tema, e, desde o Ensino Fundamental, estudam as línguas de suas comunidades, de acordo com sua identidade. Uns têm aula de Macuxi e outros, de Wapixana. A integração é tamanha que alguns alunos, depois de aprenderem uma das línguas, pedem para frequentar as aulas do outro idioma.
Escolas em ação
Conheça outras práticas que são desenvolvidas por escolas em várias partes do país:
– Projeto possibilita a estudantes resgatarem cultura de território no interior do Ceará
– Escola trabalha para resgatar valores e culturas de assentamentos
– Estudantes criam dicionário para valorizar variante linguística da comunidade
– Escola cria projeto para fortalecer identidade negra e quilombola na Bahia
– Em Jacareí (SP), “Moçambique nas escolas” faz da cultura afro ferramenta de ensino
Tecnologia a serviço da cultura imaterial
Conhecida por ser um dos pontos turísticos de Salvador (BA), a Ilha de Maré, a cinco quilômetros de São Tomé de Paripe, subúrbio da capital, traz também a história africana enraizada em seu território, ocupado por nove comunidades quilombolas. Os mais de 5 mil moradores têm, no mar, sua maior fonte de sustento. A maior parte da população vive da pesca, do transporte marítimo ou da coleta de mariscos, feita especialmente por mulheres quilombolas, chamadas de marisqueiras.
O Instituto de Mídia Étnica (IME), em parceria com o Center for Civic Media, do Massachusetts Institute of Technology (MIT- EUA), trouxe para a Ilha de Maré, a tecnologia Vojo, que possibilita a transmissão de informações sem precisar acessar a internet ou estar conectado a computadores.
As oficinas de formação nesta tecnologia duraram cerca de dois meses e contribuíram com a formação em comunicação de 20 jovens quilombolas das comunidades de Bananeiras, Martelo, Porto dos Cavalos, Maracanã e Praia Grande, todas situadas na ilha.
Os encontros falavam sobre direito humano e democratização da comunicação, identidade negra, questões de gênero, direitos sexuais e reprodutivos, e contavam também com oficinas sobre o jornalismo destinado à internet e como realizar entrevistas utilizando o celular.
Para saber mais
Artigo:
– Educação e Patrimônio: O papel da Escola na preservação e valorização do Patrimônio Cultural
Publicações:
– Patrimônio cultural imaterial – Para saber mais
– Educação, memória e identidade: dimensões imateriais da cultura material escolar