Programa ACESSE propõe que a sala de aula seja um espaço de criação

O programa ACESSE apresenta metodologias para educadores promoverem pesquisa, criação e aprendizagem mão na massa com as turmas

Os espaços de aprendizagem podem ser muito mais do que uma sala de aula com carteiras enfileiradas, que contém sujeitos imóveis e silenciosos, e onde alguns vão para ensinar e outros para aprender. De outro modo, podemos encarar esse lugar como um ateliê, em que os estudantes constroem conhecimentos, apoiados por um professor-mediador, a partir do recurso que mais promove aprendizagens significativas: a experimentação. 

O ACESSE – Arte Contemporânea e Educação em Sinergia no SESI (Serviço Social da Indústria), elaborado em parceria com o Centro de Referências em Educação Integral, tem por objetivo apoiar os educadores a trabalhar nessa perspectiva, incentivando os estudantes a criar ou construir algo, físico ou digital, que mobilizará vários objetos de conhecimento das diferentes áreas. 

Em uma aula de Geometria, por exemplo, é possível convidar os estudantes a construir uma estrutura geodésica, em que será necessário estudar as formas de planejamento para estruturação dos módulos. Em Física, podem pensar na interação de diferentes fenômenos com essa estrutura; em História, os adolescentes podem pesquisar em que momentos essas cúpulas foram utilizadas e o quê elas refletiam em termos políticos, econômicos e culturais.

Ao longo desse trabalho, o estudante desenvolve ainda uma série de competências, como sistematizar as informações estabelecendo comparações e relações, exercitar a persistência e o pensamento crítico, notar o que sabe e o que ainda precisa aprender para atingir determinado objetivo, e aprimorar a argumentação para trabalhar em grupo ou apresentar seus resultados para a turma. 

“A experiência promove aprendizagens significativas porque diz de algo que nos atravessa, porque mobiliza habilidades sociais, afetivas e cognitivas, e permite o exercício de linguagens múltiplas a partir da subjetividade de cada um”, afirma Felipe Arruda, gestor cultural, diretor executivo do Museu Judaico de São Paulo e membro do conselho consultivo do ACESSE.

Criação, imaginação e mão na massa

É para agir sobre o mundo, a realidade do mercado de trabalho e outros contextos reais da vida, que os objetos de conhecimento são acionados. Essa perspectiva é alinhada aos principais marcos legais da Educação brasileira, como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), e atende às transformações do Novo Ensino Médio, etapa da Educação Básica para a qual o ACESSE é voltado.

“Ao explorar as materialidades somos capazes de imaginar e criar coisas, formas de agir e de organizar nossas vidas, que nos possibilitam realizar nossos sonhos e atendem nossas necessidades. Mas essa criação precisa ser exercitada de forma crítica, criativa e reflexiva, porque criar algo implica uma responsabilidade ética pelo que criamos e seus desdobramentos”, explica Maria Antonia Goulart, uma das coordenadoras do ACESSE. 

Nesse sentido, além de incentivar os estudantes a colocarem a mão na massa e criar, o programa estimula que o façam de forma crítica, a partir de questões da atualidade. Em Itajaí (SC), uma das escolas da rede SESI que participou do programa viu surgir no meio do pátio um muro com textos, imagens e sons relatando as vivências e violências que sofrem refugiados no Brasil. A partir de um assunto que vivenciam cotidianamente na cidade, os estudantes realizaram uma série de pesquisas em diferentes áreas do conhecimento e transformaram os resultados em uma intervenção que chama atenção para as fronteiras, visíveis e invisíveis, que segregam os seres humanos. 

“A arte traz uma pergunta essencial: e se fosse diferente?”, provoca Felipe Arruda.

“Vivemos em uma sociedade global que demanda cada vez mais uma cidadania participativa, crucial para a manutenção da democracia, e como todo problema humano é um problema de imaginação, precisamos ser capazes de imaginar novas formas de fazer as coisas. Nesse sentido, a arte traz uma pergunta essencial: e se fosse diferente? Então o pensamento criativo não serve só para produzir beleza, mas tem a ver com a escola ser um laboratório criativo de pensar novos mundos”, diz Felipe.

A importância do compartilhar

Nesse exercício de olhar para o mundo, o outro é indispensável. Por isso, a abordagem metodológica do programa privilegia trabalhos em grupos e com a ampliação de repertório cultural e artístico, para que a fricção entre pontos de vista gere novos conhecimentos, bem como desenvolva a capacidade de colaboração e o respeito à diversidade.

“Depois vem o exercício de criar a forma de compartilhar esse saber, pensando em como afetar os outros, que tipo de sentidos ela será capaz de disparar. Então se a escola for esse lugar de produzir e fazer circular conhecimento, ela é como um ateliê”, reafirma Maria Antonia. 

Depois de criar e fazer circular o conhecimento, os professores têm a tarefa de avaliar a turma, mas novas formas de ensinar requerem outros jeitos de avaliar. No ACESSE, o programa estimula o trabalho com portfólios, digitais ou não, que refletem a construção dos conhecimentos pelos estudantes ao longo do processo, tornando a aprendizagem visível. Isso também pode ser combinado com autoavaliação, avaliação dos tutores e entre pares.

“É mais criativo, inventivo, dinâmico, e dialoga com a sociedade contemporânea. Se pensarmos em currículo, hoje é muito mais o LinkedIn e menos o curriculum vitae, por exemplo”, diz Maria Antonia.

O ACESSE, que já alcançou quase 300 educadores de 10 estados brasileiros, agora está disponível para todos os professores e professoras do Brasil, de forma gratuita, na plataforma do programa. Noale Toja, uma das formadoras do ACESSE, relata que nas experiências que conduziu, viu professores conseguindo quebrar padrões e inovar: “As pessoas vão percebendo o quanto são criativas e que há outros meios de aproximação com os desafios”.