Programa ACESSE oferece referências, meios e procedimentos da arte contemporânea para ampliar oportunidades de experimentação nas escolas para todos os professores
Grandes pensadores(as), pesquisadores(as) e cientistas da humanidade eram também artistas: uma evidência de que as áreas do conhecimento estão mais conectadas do que o modelo escolar tradicional nos faz acreditar. É para apoiar os educadores a articularem as áreas do conhecimento e expandirem as possibilidades de experimentação, por meio de referências, meios e procedimentos da arte, que surge o programa ACESSE – Arte Contemporânea e Educação em Sinergia no SESI (Serviço Social da Indústria), criado em parceria com o Centro de Referências em Educação Integral.
“É um desperdício separar arte e educação porque arte é, e sempre foi, um excelente disparador de produção de conhecimento. Só aprendemos quando algo faz sentido, faz perceber e sentir algo, e o trabalho do artista é esse: buscar formas potentes de tocar o outro. É também por isso que a educação integral preconiza não separar sentimento e cognição”, diz Maria Antonia Goulart, membro da equipe coordenadora do ACESSE.
A arte contemporânea, em especial, tem a característica de dialogar com o não-saber, convidando os observadores a adotarem uma postura ativa de questionar e interpretar as obras, que se relacionam com temas da atualidade, em contato direto com a vida e a realidade de professores e estudantes. Uma vez engajados nas discussões, é mais fácil extrapolar a abordagem para o tempo histórico, o espaço geográfico, as minúcias do próprio tema e para o trabalho entre áreas do conhecimento.
“Trata-se de um espaço para o educador e o estudante dizerem o que significa e o que sentem diante do que conhecem e do que estão pesquisando, o que é ainda mais importante nesse momento tão difícil de crise, principalmente no Ensino Médio, onde há muita evasão. A escola se torna, portanto, um lugar para cada um chegar com seu repertório, significar seu conhecimento e compartilhá-lo, em uma perspectiva bem freiriana”, sintetiza Luciana Oliveira, uma das formadoras do programa.
A experimentação, ponto tão marcante da arte contemporânea, também é fundamental em processos de ensino e aprendizagem inovadores, e é um dos pilares do Novo Ensino Médio brasileiro. “A arte é muito mais próxima das Ciências do que imaginamos, porque ambas trabalham com pesquisa, criatividade e abraçam o acaso, afinal, quantos remédios foram descobertos sem querer?”, lembra Marcus Lontra, crítico de arte, curador independente e membro do conselho consultivo do programa ACESSE.
“No campo das tecnologias digitais a ação artística também é relevante para promovermos aproximações e reflexões sobre a forma como elas são criadas, utilizadas e transformadas“, continua o especialista.
“Vejo muitos educadores descobrindo que existe criatividade e criação em todas as áreas, e descobrindo como a sua própria maneira de criar funciona”, conta a formadora Tatiana Martins.
Para oferecer condições de escolas e educadores trabalharem nessa perspectiva integradora e humanizada, o programa ACESSE aborda a arte a partir da noção de que ela faz parte de todos os seres humanos enquanto uma de nossas linguagens possíveis, distanciando-se do domínio de técnicas rebuscadas ou da ideia de que existe um “talento” que nasceria com algumas pessoas e permitiria tais criações. “A arte é uma resposta humana à interpretação do mundo e das angústias que nos rodeiam, com a construção de um artefato, de produtos, que permitem que essas interpretações circulem com mais facilidade”, explica Marcus.
Nas experiências de formação docente em andamento por meio do ACESSE, por exemplo, surgem relatos de professores de Física e Matemática, sobretudo, descobrindo novas formas de abordar os temas de suas áreas, como o caso de um docente que usou obras de um artista indígena para discutir proporção, dimensões e ângulos com a turma. “Vejo muitos educadores descobrindo que existe criatividade e criação em todas as áreas, e descobrindo como a sua própria maneira de criar funciona”, conta a formadora Tatiana Martins.
Ao longo da formação, explorando os materiais didáticos e vídeo-aulas disponíveis gratuitamente na plataforma do programa ACESSE, olhando para a cultura de seus territórios e do que interessa a si e a seus estudantes, os professores têm a oportunidade de conhecer mais produções artísticas e culturais. Nos materiais da formação há, por exemplo, uma linha do tempo da arte, da tecnologia e da indústria cheia de referências.
Para Felipe Arruda, gestor cultural, diretor executivo do Museu Judaico de São Paulo e membro do conselho consultivo do ACESSE, a apropriação desse repertório artístico-cultural pelos professores e estudantes significa poder conhecer diferentes pontos de vista e formas de abordar um mesmo tema. É, ainda, uma oportunidade de estimular os adolescentes a fazerem perguntas sobre seu entorno “sem necessariamente respondê-las, mas mantendo a chama da curiosidade viva, sempre questionando as formas de compreensão e de se mover pelo mundo”.
Nos materiais também são detalhados processos de criação de artistas brasileiros do acervo do Prêmio Indústria Nacional Marcantonio Vilaça, uma iniciativa do SESI, destacando as formas que utilizaram para promover apropriações, deslocamento e associações, e criar novos sentidos. Ao identificar a potência de algo ser mais de uma coisa ao mesmo tempo e os vários sentidos que aquilo tem de acordo com cada sociedade e cultura, a interdisciplinaridade fica mais evidente.
“É por meio da ampliação do repertório cultural e artístico dos professores que a articulação entre as áreas do conhecimento se torna mais fluida porque as possibilidades de fazer conexões se ampliam e porque a arte contemporânea dificilmente fala de uma área só. É de sua natureza provocar associações, deslocamentos, relações entre espaço, corpo, tempo, conhecimento novo e repertório prévio”, afirma Maria Antonia.