publicado dia 09/12/2016

ONU afirma que PEC 55 vai na contramão dos direitos humanos

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A ONU reconheceu que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 55 vai aumentar a desigualdade no país. O relator especial para a extrema pobreza e direitos humanos, Philip Alson, divulgou um comunicado nesta sexta-feira (9/12) no qual afirma que “os planos do governo para congelar os gastos sociais no Brasil por 20 anos são totalmente incompatíveis com as obrigações do país em matéria de direitos humanos”. A recomendação também foi endossada pela relatora especial sobre o direito à educação da ONU, Boly Barry.

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O coordenador geral da Campanha Nacional pela Educação, Daniel Cara, durante reunião na ONU.

Em outro trecho do documento, o especialista aponta que, se adotada, a medida vai diminuir drasticamente os investimentos em saúde, educação e segurança social colocando uma geração inteira em padrões de segurança social bem inferiores aos já vigentes.

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A orientação da entidade é que o governo identifique outras alternativas para resolver a crise financeira, reconhecendo que, se adotada, colocará o Brasil “em uma categoria única em matéria de retrocesso social”.

O posicionamento da ONU tem relação direta com a denúncia que a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, juntamente com outras 16 organizações de direitos humanos, fez na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA) contra a proposta.

Sem investimentos

Segundo estudo técnico realizado pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, o impacto da PEC 55 para a educação seria a redução em uma escala de R$ 32.2 bilhões nos próximos 10 anos. Para o coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, isso significa que nenhum investimento novo será destinado à construção de escolas, pré-escolas, creches, à ampliação da qualidade das universidades públicas e da educação básica, ou ao salário dos professores.

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“Em resumo, a PEC 55/2016 inviabilizará as metas e estratégias do Plano Nacional de Educação 2014 – 2024 (Lei 13.005/2014), principal diretriz para a educação nacional nos próximos 10 anos. Ela representa ameaça também ao direito ao acesso à educação, colocando em risco a educação de cerca de 3,8 milhões de crianças e adolescentes de 4 a 17 anos, que estão fora da escola, de acordo com pesquisa da Campanha Nacional pelo Direito à Educação e do Unicef”, sustentou Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação.

Leia a nota da ONU sobre a PEC 55:

NOTA À IMPRENSA

Brasil: Teto de 20 anos para o gasto publico violará direitos humanos, alerta relator da ONU

GENEBRA (9 de Dezembro, 2016) – Os planos do governo de congelar o gasto social no Brasil por 20 anos são inteiramente incompatíveis com as obrigações de direitos humanos do Brasil, de acordo com o Relator Especial da ONU para extrema pobreza e direitos humanos, Philip Alson.

O efeito principal e inevitável da proposta de emenda constitucional elaborada para forçar um congelamento orçamentário como demonstração de prudência fiscal será o prejuízo aos mais pobres nas próximas décadas, alertou o Relator. A emenda, que deverá ser votada pelo Senado Brasileiro no dia 13 de Dezembro, é conhecida como PEC 55 ou o novo regime fiscal.

“Se adotada, essa emenda bloqueará gastos em níveis inadequados e rapidamente decrescentes na saúde, educação e segurança social, portanto, colocando toda uma geração futura em risco de receber uma proteção social muito abaixo dos níveis atuais.”

O Relator Especial nomeado pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU recomendou ao Governo Brasileiro que garanta um debate público apropriado sobre a PEC 55, que estime seu impacto sobre os setores mais pobres da sociedade e que identifique outras alternativas para atingir os objetivos de austeridade.

“Uma coisa é certa”, ele ressaltou. “É completamente inapropriado congelar somente o gasto social e atar as mãos de todos os próximos governos por outras duas décadas. Se essa emenda for adotada, colocará o Brasil em uma categoria única em matéria de retrocesso social”.

O plano de mudar a Constituição para os próximos 20 anos vem de um governo que chegou ao poder depois de um impeachment e que, portanto, jamais apresentou seu programa a um eleitorado. Isso levanta ainda maiores preocupações sobre a proposta de amarrar as mãos de futuros governantes.

O Brasil é a maior economia da América Latina e sofre sua mais grave recessão em décadas, com níveis de desemprego que quase dobraram desde o início de 2015.

O Governo alega que um congelamento de gastos estabelecido na Constituição deverá aumentar a confiança de investidores, reduzindo a dívida pública e a taxa de juros, e que isso, consequentemente, ajudará a tirar o país da recessão. Mas o relator especial alerta que essa medida terá um impacto severo sobre os mais pobres.

“Essa é uma medida radical, desprovida de toda nuance e compaixão”, disse ele. “Vai atingir com mais força os brasileiros mais pobres e mais vulneráveis, aumentando os níveis de desigualdade em uma sociedade já extremamente desigual e, definitivamente, assinala que para o Brasil os direitos sociais terão muito baixa prioridade nos próximos vinte anos.”

Ele acrescentou: “Isso evidentemente viola as obrigações do Brasil de acordo com o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais que o pais ratificou em 1992, que veda a adoção de “medidas deliberadamente regressivas” a não ser que não exista nenhuma outra alternativa e que uma profunda consideração seja dada de modo a garantir que as medidas adotadas sejam necessárias e proporcionais.”

O Sr. Alston apontou que, nas ultimas décadas, o Brasil estabeleceu um impressionante sistema de proteção social voltado para erradicar a pobreza e o reconhecimento dos direitos à educação, saúde, trabalho e segurança social.

“Essas políticas contribuíram substancialmente para reduzir os níveis de pobreza e desigualdade no país. Seria um erro histórico atrasar o relógio nesse momento,” disse ele.

O Plano Nacional de Educação no Brasil clama pelo aumento de 37 bilhões de reais anualmente para prover uma educação de qualidade para todos os estudantes, enquanto a PEC reduzirá o gasto planejado em 47 bilhões de reais nos próximos oito anos. Com mais de 3,8 milhões de crianças fora da escola, o Brasil não pode ignorar o direito deles de ir à escola, nem os direitos de todas as crianças a uma educação de qualidade.

O debate sobre a PEC 55 foi apressadamente conduzido no Congresso Nacional  pelo novo Governo com a limitada participação dos grupos afetados, e sem considerar seu impacto nos direitos humanos. Um estudo recente sugere que 43% dos brasileiros não conhecem a emenda, e entre aqueles que conhecem, a maioria se opõe a ela.

O relator especial, que está em contato com o Governo Brasileiro para entender melhor o processo e a substancia da emenda proposta, ressaltou que “mostrar prudência econômica e fiscal e respeitar as normas internacionais de direitos humanos não são objetivos mutuamente excludentes, já que ambos focam na importância de desenhar medidas cuidadosamente de forma a evitar ao máximo o impacto negativo sobre as pessoas.”

“Efeitos diretamente negativos têm que ser equilibrados com potenciais ganhos a longo prazo, assim como esforços para proteger os mais vulneráveis e os mais pobres na sociedade”, disse ele.

“Estudos econômicos internacionais, incluindo pesquisas do Fundo Monetário internacional, mostram que a consolidação fiscal tipicamente tem efeitos de curto prazo, reduzindo a renda, aumentando o desemprego e a desigualdade de renda. E a longo prazo, não existe evidência empírica que sugira que essas medidas alcançarão os objetivos sugeridos pelo Governo,” salientou o relator especial.

O apelo do Sr. Alston às autoridades brasileiras foi endossado também pelos a Relatora Especial sobre o Direito à Educação,  Sra. Koumbou Boly Barry.

Os Relatores Especiais são parte do que é conhecido como Procedimentos Especiais do Conselho de Direitos Humanos. Procedimentos Especiais, o maior corpo de peritos independentes do sistema ONU para Direitos Humanos, é o nome dado aos mecanismos independentes para monitoramento do Conselho. Relatores especiais são especialistas em direitos humanos apontados pelo Conselho de Direitos Humanos para tratar de questões específicas de país ou temáticas em todo o mundo. Eles não são funcionários da ONU e são independentes de qualquer governo ou organização. Eles servem em capacidade individual e não recebem salário por seu trabalho. Para mais informações, consulte: http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/SP/Pages/Welcomepage.aspx

Direitos Humanos da ONU, página do país – Brasil:  http://www.ohchr.org/EN/countries/LACRegion/Pages/BRIndex.aspx

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