publicado dia 20/12/2016

Fundamental II é foco da plataforma “Faz Sentido”, voltada para docentes e gestores

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A recente proposta de reforma do ensino médio e ocupações de escolas pelo movimento secundarista colocou em debate os desafios e as demandas dessa etapa do ensino. Para muitos especialistas, entretanto, os problemas que ali se apresentam já se iniciam anteriormente, no ensino Fundamental II.

Para Anna Penido, diretora-executiva do Instituto Inspirare, a etapa que compreende do 5º ao 9º ano é uma espécie de “filha do meio de pais separados”. Majoritariamente, está a cargo dos municípios, mas os estados também são responsáveis por sua oferta. A situação faz com que a atenção para esses anos finais do Fundamental esteja diluída.

Entretanto, não faltam pontos críticos na etapa que compreende um momento peculiar no qual se dá a passagem da infância para a adolescência. A perda gradativa de engajamento dos estudantes, o aumento da dificuldade de aprendizagem e a indisciplina são alguns desses desafios que, para Anna, devem ser entendidos como sintomas e não como causas dos problemas. Sintomas de uma educação na qual o adolescente não encontra sentido.

Andréa Azambuja, do Grupo Tellus, sintetiza os dilemas da etapa. ” É um período de intensa atividade – e potencialidade – cerebral, de profundas transformações emocionais, sociais, psíquicas, físicas e, paralelamente, de pouco acolhimento para os adolescentes. Os familiares se afastam da vida escolar, a escola muda totalmente e, ao passo que exige muita autonomia, cria poucas oportunidades para a participação estudantil, não considera a rotina dos alunos nos anos anteriores, não dialoga com as suas realidades. O conflito, interno e externo, é constante, o salto que se espera do adolescente é gigante, mas o apoio é muito falho – o que se reflete nas estatísticas, desastrosas. De todos que concluem o Fundamental II, só 23% têm conhecimento adequado em Português e 11% em Matemática”.

Boas experiências

Com o objetivo de mapear os principais desafios dos anos finais do Fundamental e propor soluções inovadoras, baseadas em boas práticas já identificadas e sistematizadas, o Instituto Inspirare, o Grupo Tellus, Instituto Unibanco, Laboratório de Mídia e Educação (Mel) e Laboratório de Inovação Educacional (LABi) se uniram para construir a plataforma Faz Sentido.

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Germano Guimarães, cofundador e diretor do Grupo Tellus, conta que a plataforma tem como objetivo auxiliar docentes e gestores a criarem respostas inovadoras para obstáculos comuns no cotidiano da sala de aula, do bullying à questões ligadas à sexualidade, passando pela demanda por aulas mais criativas e participativas.

Anna Penido destaca o formato amigável e de fácil utilização da ferramenta virtual. “É bastante interativa, e a ideia é construí-la de forma colaborativa, com o compartilhamento de boas práticas coletadas por meio de um mapeamento”.

Andréa explica que as propostas englobam desde medidas de aplicação mais imediata, como outras de médio e longo prazo. Elas englobam cartões de recomendações: pílulas de conhecimento e insights relevantes que podem abrir muitas portas; cartões de práticas pedagógicas e de gestão: práticas criadas por educadores de todo o Brasil que deram certo, com o passo a passo detalhado para que possam ser replicadas e adaptas com facilidade; estudos: referências e exemplos do que sem dado certo na educação. “Tudo pode ser pesquisado por temas específicos, por exemplo, adolescência, família e comunidade, gestão, avaliação, formação de educadores, currículo… Ou seja, se o professor quer trabalhar a sexualidade em aula e não sabe como, basta procurar dicas e experiências lá”.

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Outra ferramenta disponível é a Trilha, pensada para propostas para toda a rede. Como é interativa, pode ser adaptada ao perfil e demandas de cada município ou estado. “A ideia é que as necessidades e prioridades detectadas na rotina influenciem diretamente as políticas públicas. Além disso, nesse momento, estamos trabalhando nas Trilhas da escola e na do professor. No futuro, a ideia é construir a do aluno. Estas Trilhas, claro, se comunicam, se encontram o tempo todo, mas permitem certa autonomia para esses atores transformarem e ressignificarem as suas práticas”, conta Andréa.

Anna Penido acredita que a plataforma pode ser importante na consolidação de boas práticas que muitas vezes ficam cincunscritas a poucas instituições. “Há escolas fazendo coisas criativas, inovadoras, usando arte, tecnologia, envolvendo a comunidade. Mas elas não são incorporadas por contingente maior de escolas, não se enraízam nas redes e não se tornam políticas públicas”, aponta.

Janela de oportunidades

Ela ainda aponta que o Fundamental II, apesar dos problemas, possui talvez uma maior capacidade de mudança em relação ao ensino médio, quando alguns dos gargalos que se iniciam entre o 5º e o 9º ano se consolidam. “Embora aí surjam os primeiros atritos entre alunos, docentes e escola e onde a aprendizagem e desenvolvimento começam a se tornar mais dificultosos, os adolescentes ainda curtem e gostam da escola e reagem positivamente quando professor faz algo que contempla o interesse deles. Nessa fase ainda há um interesse pela figura do professor, ao contrário do ensino médio, no qual essa relação por vezes já está mais esgarçada”, opina.

Germano faz uma leitura similar. “No trabalho com esses adolescentes temos uma janela de oportunidades. O cérebro deles tem maior plasticidade e estão mais abertos e experiências. E as vivências positivas vividas nessa etapa influenciam o desenvolvimento integral. É importante que o jovem vá para o ensino médio com essas boas referências”, completa.

Os materiais

Segundo Andréa Azambuja, os materiais foram construídos de forma colaborativa concomitantemente à experimentação deles em duas redes de ensino: São Miguel dos Campos (AL) e Salvador (BA). “O contato inicial com elas foi feito pela articulação direta do Inspirare com os secretários de educação destes municípios. Antes de começarmos qualquer coisa, houve um período intenso de entendimento de cenário, com muita pesquisa, idas a campo, grupos de trabalho, escutas, oficinas com centenas de professores, gestores, alunos, especialistas, técnicos. Só após este entendimento, começamos a construir os materiais a muitas mãos e a testá-los, afinando, corrigindo, repensando detalhes imediatamente”.

Ele ainda comenta que a plataforma ainda está num momento mais experimental, mas já vem recebendo retornos positivos. “Queremos buscar as redes públicas – que são responsáveis por 80 a 90% dos nossos acessos – procurar novos parceiros e difundir mais a plataforma”, comenta.

Os idealizadores acreditam que a página possui um grande potencial como ferramenta em processos de formação docente. “Eles precisam criar mecanismos para lidar com esse jovem do século 21, um jovem que quer mais diálogo e escuta, quer discutir junto e não mais ser educado de cima para baixo. Os estudantes querem mais autonomia e para isso é preciso que o docente também possa ter mais autonomia e a plataforma pode ajudar nesse sentido”, conclui.

Livro relata 13 experiências educativas inovadoras

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